terça-feira, 31 de julho de 2018

Digitalização do trabalho e a escravidão no século 21

31.07.2018

Marcelo Menna Barreto


A Indústria 4.0 vai dispensar a força de trabalho e com isso tornar mais lucrativa a produção
(Foto: Antonio Scarpinetti/Unicamp)

Ricardo Antunes é considerado um dos principais sociólogos do trabalho no Brasil e há dez anos leciona em um curso sobre trabalho e imigração na Universidade Ca’Foscari de Veneza, onde tem acompanhado de perto os fluxos migratórios na Itália. Titular da cátedra de Sociologia do Trabalho na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), autor de livros publicados nos Estados Unidos, Inglaterra, Holanda, Itália, Argentina, Venezuela, Colômbia e Espanha, Antunes fala nesta entrevista sobre o seu novo livro O Privilégio da Servidão – O novo proletariado de serviços na era digital, publicado pela Boitempo. De forma entusiasmada, por vezes indignada, o autor aborda as transformações das relações de trabalho no Brasil do período da redemocratização ao impeachment de Dilma Rousseff e os dois anos de Temer, que identifica como contrarrevolucionário e terceirizado. E enumera os problemas da Indústria 4.0, a era do trabalho digitalizado, que considera a nova forma de escravidão do século 21. “Na escravidão o senhor de terras comprava o escravo de um traficante. No mundo moderno, a empresa aluga de outra empresa o trabalho de homens e mulheres”, compara.

Extra Classe – Em uma passagem do seu livro o senhor diz que vivemos um período excepcional da nossa história. Como é a realidade desse laboratório social que o senhor descreve?

Ricardo Antunes – Estamos em um período, digamos, inusitado na história desde o século 19. Estivemos, entre 2009, 2010 e 2011, numa era de rebeliões em todo o Oriente Médio, a partir da Tunísia e Egito, e nos principais países do Ocidente, avançando pela Inglaterra, França, Portugal, Espanha, e Estados Unidos com o Occupy Wall Street. Foram muitas manifestações que mostravam que o cenário social vinha mudando. Aquele cenário anterior de representações partidárias e sindicais, dando conta da totalidade das forças sociais sinalizava uma crise profunda e até mesmo esgotamento. Mas é tão espetacular esse período que a era de rebeliões não se converteu em uma era de revoluções.

Como assim?

Uma era de rebeliões que não se converteu em uma era de revoluções anticapitalistas. Houve revoluções democráticas em vários países do Oriente Médio, mas o mais surpreendente e mesmo trágico deste cenário é que esta espetacular era das rebeliões se metamorfoseou numa era de contrarrevoluções. Estamos vivendo hoje um cenário abertamente contrarrevolucionário.

Quais são as evidências?

O sociólogo Florestan Fernandes usou o conceito da contrarrevolução preventiva, mesmo quando não há o risco das revoluções. Ele pensava na América Latina. Nós estamos vivendo um cenário mundial de contrarrevoluções preventivas mesmo quando não há o risco das revoluções socialistas ou anticapitalistas. Então, por exemplo, um sinal desse cenário, Donald Trump, nos Estados Unidos. Trump mudou todo o tabuleiro internacional, um nacionalismo de uma era financeira que fere de certo modo o interesse do grande capital e das grandes corporações que caminhavam em direção a uma Europa unificada, o Nafta, Ásia-Pacífico. Então, de repente você tem um movimento de extrema direita muito forte com base popular que quebra, que começa a mexer nesse tabuleiro. Theresa May, na Inglaterra, tem um processo similar ao Brexit. De repente se rompe com todo o esquema montado para uma Europa unificada. E você tem no cenário mais abertamente político um Emmanuel Macron, na França. E se não fosse Macron, seria Marine Le Pen! Mauricio Macri, na Argentina. Enfim, um cenário contrarrevolucionário, para não ficar só nos países da Europa, com o nazismo se expandindo significativamente na Áustria, Polônia, na Hungria. Enfim, nós estamos em um momento em que a história vive um cenário tenebroso.

É o laboratório social ao qual o senhor se refere?

Quando eu falava em laboratório me referia a que todas as janelas estão abertas. Da era das rebeliões à era das revoluções, assim como para a era das rebeliões à era das contrarrevoluções que nós estamos vivendo hoje. É nesse cenário, comandado pela hegemonia financeira profundamente destrutiva, que é marcada por uma agressividade neoliberal ainda maior, como se a gente tivesse numa terceira fase ainda mais agressiva do neoliberalismo e onde a revolução, a reestruturação permanente do capital, ou a reestruturação produtiva do capital, se tornou permanente. Estamos na Europa hoje com o debate da Indústria 4.0. Tudo isso levou os capitais a exigirem uma devastação do trabalho em escala global. Não é por acaso que as reformas trabalhistas no Brasil – da contrarrevolução de Temer; na Argentina, de Macri; e na França, de Macron, são muito assemelhadas e tenham ocorrido quase simultaneamente, para não citar outros exemplos. É esse cenário que eu dizia que configura, no momento que eu finalizei esse meu livro, um cenário de contrarrevolução permanente, de amplitude global.

O que vem a ser a Indústria 4.0?

Houve a revolução industrial, depois houve a expansão do século 20 para o Taylorismo, a indústria automotiva; depois houve a produção dos anos 1970, 1980, 1990 para cá, e agora é o momento da quarta revolução industrial, a digitalização das coisas. É a internet das coisas. É digitalizar o espaço fabril, no sentido amplo – pode ser uma fábrica de automóveis, pode ser uma fábrica hospitalar, pode haver uma fábrica da educação. Digitalizando tudo o que você pode digitalizar você vai criando uma massa limitada de empregos mais qualificados e vai criar uma massa imensa de desempregados que não têm condições de suprir esses empregos qualificados que são reduzidos. Qual é o segredo da digitalização, que os capitais não dizem, que a CNI não diz, que as Febrabans não dizem? A indústria 4.0 vai dispensar a força de trabalho e com isso tornar mais lucrativa a produção.

Na Indústria 4.0, as máquinas estão conectadas em todas as etapas da cadeia produtiva:
“o que nós estamos vendo é uma mutação profunda no mundo do trabalho”
(Foto: Antonio Scarpinetti/Unicamp)

Em seu livro, o senhor aborda as principais mudanças trabalhistas que ocorreram no Brasil desde a redemocratização até o impeachment. Por que a década de 1980 foi o período mais importante dessas transformações?

Veja bem, esse período brasileiro é bastante interessante porque ele é muito complexo. Quando nós começamos a redemocratização, depois do fim da ditadura militar, tivemos um período que foi espetacular no Brasil. A década de 1980 foi a mais importante década deste último período. Talvez uma das mais importantes décadas do Brasil ao longo do século 20. Os capitais costumam dizer que a década de 1980 foi uma década perdida. Para eles, talvez tenha sido, mas no caso brasileiro, no ano de 1980 nós tivemos a criação do PT, que na sua proposta inicial era um partido independente e de classe; a criação da CUT, que era uma reivindicação histórica da classe trabalhadora brasileira, que tinha tentado inúmeras vezes formar uma central sindical e via essa proposta ser tolhida; e a criação do MST, organizando os trabalhadores do campo. Só para pegar três exemplos. Foi um período espetacular. O Brasil teve praticamente as mais importantes greves do mundo. Fizemos quatro greves gerais e chegamos à Constituição de 1988, conseguindo criar uma Constituição que, de certo modo, estabelecia um sistema de organização da relação capital e trabalho com alguns traços de civilidade.

Por que setores da esquerda não aceitaram muito bem a Constituição de 1988 à época da promulgação?

Aqui eu faço um parêntese. Nós que militávamos, estudávamos e vivíamos na década de 1980 já no sentido social e político achávamos a Constituição de 1988 insuficiente, porque houve um momento em que o Centrão fez um pântano que, digamos assim, comanda até hoje o parlamento brasileiro e impediu algumas medidas mais profundas. Por exemplo, aprovamos o direito de greve, que é uma grande conquista para a classe trabalhadora, mas a regulamentação da greve seria feita posteriormente. Ou seja, caiu no pântano. Mas ainda assim, em 1988 se desenhou um Estado com alguns valores públicos, coletivos e sociais que contraditavam a tendência neoliberal. Isto vigorou até 1989/1990.

Até a era Collor?

Sim! Em 1989 houve a eleição que dividiu o país ao meio e a partir dessa divisão, a vitória do Collor, que iniciou o que eu chamei de desertificação neoliberal no Brasil. Collor era uma aberração, como agora estamos perto de novas aberrações. As classes dominantes, quando não têm alternativas sólidas, apelam para aberrações. Nossa classe dominante tem faces fascistas em muito dos seus setores. Veja só: dirigentes da Confederação Nacional da Indústria disseram recentemente que dialogam muito bem e vêem com simpatia a candidatura do Bolsonaro. Basta isso como exemplo.

Como o senhor avalia o período FHC?

Se com Collor veio a primeira devastação neoliberal, que foi travada com a sua deposição, a vitória do Fernando Henrique Cardoso trouxe um quadro mais complexo. Com FHC iniciava-se uma fase neoliberal dotada de racionalidade burguesa. Se a fase do Collor foi um neoliberalismo devastador, eivado de irracionalidade da sua conduta, da sua personalidade, FHC foi claro no discurso de posse: eu vou implantar a política do Collor sem as maluquices que ele tentou, sem base nenhuma, e uma personalidade completamente fora dos padrões. A partir daí nós tivemos, de fato, o início da efetiva desertificação neoliberal. Só que para o FHC quebrar a CLT não era fácil. A CLT é uma espécie de Constituição para a classe trabalhadora. Os trabalhadores não sabem bem como é a sua Constituição, mas eles sabem que a CLT traz direitos, décimo-terceiro, descanso semanal, férias, etc, etc, que permitem um salário mínimo, que permitem esses direitos longamente conquistados. FHC não conseguiu quebrar a CLT, a espinha dorsal da legislação protetora do trabalho no Brasil, porque o movimento sindical resistia.

“O problema, o pavor do capital, nesse cenário que nós temos hoje é que o trabalho não
desapareceu. Ele é trabalho ultraqualificado, semiqualificado, manual, escravo, semiescravo,
análogo à escravidão, infantil” (Foto: Capa de Blood and Earth: Modern Slavery,
Ecocide, and the Secret to Saving the World Hardcover, de Kevin Bales)

E a era Lula?

É curioso. Fernando Henrique faz um primeiro governo e sai bombando. No seu segundo governo, saiu pela porta dos fundos como um vira-latas que leva um pé na bunda, com níveis baixíssimos de popularidade. Não podia fazer aparições públicas, porque era vaiado. O inverso do Lula que fez um primeiro governo em que quase perdeu a reeleição, mas saiu, no segundo mandato, com uma aprovação altíssima. Só não perdeu a reeleição porque é quase impossível alguém perder para o Alckmin (risos).

O que explica a popularidade de Lula naquele momento?

O que se deu, em uma palavra, no governo Lula, que eu trato basicamente na parte três do livro é que o Lula tentou e fez uma espetacular política de conciliação de classes. O Lula é um gênio da conciliação de classes, como o Getúlio (Vargas). Para quem gosta de conciliação de classes, ele é um mito; para quem, como eu, que não gosta, ele não é mito nenhum. Mas ele é um gênio, eu tenho que reconhecer. Ele bota deus e o diabo na terra do sol e faz virar samba. Isto é uma condição que só Getúlio tinha no passado. Não é fácil essa capacidade, mas enquanto o seu governo teve uma expansão econômica, criou 20 milhões de empregos, teve uma política de assistência social muito pífia.

Quais são as suas críticas aos governos Lula?

Eu vou dizer como eleitor, não como um analista: votei no Lula não para dar um pouco a farofa aos pobres. Muitos de nós que votamos no Lula queríamos reforma agrária, controle do grande capital, controle da remessa dos lucros. A gente sabia que não era fácil, mas é muito importante lembrar que o Lula se elegeu com mais de 50 milhões de votos. Ele tinha muito capital político para dizer: agora vai ser um governo reformista para valer. É disso que estou falando, nada além disso. E não foi. Foi um governo de conciliação, que trabalhou com a ideia de que o capital ganha muito dinheiro, mas tem que sobrar alguma coisa aqui para os debaixo. Isso funcionou, o Lula tinha uma ideia desde os anos 1970, eu o conheço há muitos anos, que era assim: incrementando o mercado interno brasileiro você aumenta o salário da classe trabalhadora, ela consome e a economia vai se desenvolver. Foi isso que fez com que a expansão econômica do mercado interno brasileiro compensasse a retração do mercado externo.

Onde Lula errou?

O Lula transnacionalizou e enriqueceu uma parte importante da burguesia brasileira que agora o pôs e o quer na cadeia. Porque a política de conciliação acabou! Ele faz a sucessora, que ganha a eleição no tranco, prometendo que não ia tomar nenhuma medida destrutiva, mas a sua primeira medida foi nomear o Joaquim Levy para ministro da Fazenda. Atenção! O primeiro convidado não era o Levy, era o (Luiz Carlos) Trabuco. Imagina se a Dilma nomeia o Trabuco, o número um do Bradesco?

O senhor é bastante crítico em relação a Dilma. Por quê?

Eu digo no meu livro, a Dilma foi o maior erro que o Lula cometeu. E não foi por acaso. O Lula escolheu a Dilma, obviamente no meu entendimento, como candidata porque ele não poderia ter como seu sucessor uma sombra poderosa e autônoma, por exemplo, um Tarso Genro, que tem luz própria, está num espectro do lulismo, mas é um indivíduo que sabe para onde ir e como ir. Ele não seria um nome que teria o respaldo do Lula para ser seu sucessor, como tantos outros não teriam. Por outro lado, a Dilma tinha méritos enormes. Ela é uma executiva poderosa, uma mulher que faz a máquina funcionar.

Mas foi golpeada…

Foi um erro gravíssimo entregar o comando político do país a alguém sem nenhuma experiência política prévia. Quando o céu é de brigadeiro, tudo vai bem. Mas quando começam as tempestades, aí… E, claro que a Dilma – eu estou tratando aqui só no plano das subjetividades dos dois, não estou falando nos interesses em volta que isso eu deixo para o leitor buscar no livro – num dado momento diz: agora a presidente sou eu, agora quem vai dar o tom sou eu. E nesse momento, politicamente, começou o acerto neoliberal que ficou com a cara de impostura eleitoral em um momento de crise, com o PT mergulhado em processos de corrupção que marcam toda a história brasileira. O PT não foi o primeiro nem será o último nesse quadro, longe disto.

E o impeachment?

Uma aberração! O impeachment foi uma aberração jurídica, um golpe parlamentar. Se a gente supõe que a pessoa sofre um impeachment é porque a pessoa cometeu crime, então automaticamente seria inelegível. Na verdade, ela foi deposta porque perdeu as condições de governabilidade, como se ela fosse um primeiro-ministro. Agora, porque esse quadro complicou? Porque em 2013 a crise chega pesada aqui, e também começa a era da devastação sobre o PT.

Como o senhor avalia Temer?

É um governo contrarrevolucionário, um governo terceirizado, que teria umas funções básicas: a PEC do fim do mundo, congelar a educação, a saúde, a Previdência; privatizar tudo o que ainda não tinha sido privatizado e devastar a legislação social protetora do trabalho. Daí aprovar a Lei da terceirização total e, por fim, arrasar de vez com a Previdência, o que foi praticamente a única coisa que não conseguiu avançar. Então nós tivemos nesses últimos dois anos a derrogação de 80%, 90% do que foi criado ao longo de lutas operárias desde a década de 1910, consubstanciado depois na CLT. A CLT, aliás, é muito ardilosa. No direito à proteção do trabalho, ela é um avanço. No que diz respeito à estrutura sindical, ela é estatizante e controladora. Carregou essa ambiguidade até hoje.

Qual o saldo disso tudo?

O resultado é que desde a redemocratização, quando visualizávamos um estado social e político capaz de ser reflexo das lutas dos anos 1980, chegamos em 2018 com o Brasil se aproximando muito, mas muito celeremente à tragédia social que é a Índia, um país com milhões – não milhares – de miseráveis perambulando pelas ruas, sendo tratados como animais e cuja miséria passa a ser assimilada pelas classes médias, pelos ricos, como natural. ‘Eu quero os miseráveis longe do meu portão’. Então, nós estamos nos convertendo em um país de miseráveis, com uma população cada vez mais empobrecida, com um desemprego estrutural profundo e o trabalho intermitente que é uma farsa. Esta é a “conquista” do Temer e é um tema forte no meu livro, por isso o título O privilégio da servidão. Quem tem trabalho, trabalha e ganha; quem não tem trabalho, não ganha. E como é que vai viver? Ah, é problema seu, não tem mais nem a sopa das 18h para distribuir para os pobres. Agora é assim: quer a sopa, vai buscar no esgoto. Como eu vi na Índia.

“Agora é o momento da quarta revolução industrial, a digitalização das coisas, que vai digitalizando tudo o que pode, cria uma massa limitada de empregos mais qualificados e uma massa imensa de desempregados que não têm condições de suprir esses empregos qualificados que são reduzidos” (Foto: Antonio Scarpinetti/Unicamp)

Nessa sua nova obra, o senhor coloca uma luz sobre o trabalho digital, on-line e intermitente. Nessa época de relativização de vários conceitos, o senhor faz questão ainda de denominar esses trabalhadores como o novo proletariado de serviços. Por quê?

Porque esse é o elemento novo desses últimos 40 anos. Houve nos anos 1970 e 1980 a tese de que o trabalho estava acabando, que a classe trabalhadora ia desaparecer. Um completo engano. Eu conheço a China, eu conheço a Índia, nós conhecemos a América Latina e o que nós estamos vendo é uma mutação profunda no mundo do trabalho. O setor industrial sofreu retração, o setor agrícola sofreu retração e o mundo dos serviços sofreu uma monumental expansão. Só que não são mais os serviços que nós tínhamos nas décadas 50, 60, 70 do século passado. Hoje, por exemplo, praticamente todos os espaços do trabalho sofreram a invasão do mundo digital. O celular faz com que eu possa ser contratado para trabalhar, por exemplo, na Inglaterra, onde existe um sistema que hoje já é mundial, o contrato de zero hora. Médicos, advogados, enfermeiros, cuidadoras, zeladores, limpadores, enfim, quase todas as profissões de serviços estão disponíveis por celular. Como o contrato é de zero hora, você não tem a obrigação de atender, nem o aplicativo que ganha uma porcentagem do seu trabalho de te chamar, mas em geral, as pessoas atendem ao chamado. Se não fosse o celular esse trabalho não existiria.

Para surpresa do capital, o trabalho não acabou…

O trabalho é visto pelo capital financeiro como um apêndice, infelizmente imprescindível. Se o capital pudesse eliminar o trabalho, teria feito isso há décadas. O problema, o pavor do capital, nesse cenário que nós temos hoje é que o trabalho não desapareceu. Ele é trabalho ultraqualificado, semiqualificado, manual, escravo, semiescravo, análogo à escravidão, infantil. Isso quem nos ensinou foi um velho filósofo, o Marx.

Quais são os problemas das novas formas de contratação pelo ambiente digital?

O resultado é um mundo digitalizado, informalizado, em que as plantas produtivas flexíveis exigem um mundo sob o comando financeiro. E a lógica do capital financeiro é gerar mais dinheiro e não importa como. É explorando a classe trabalhadora em todas as suas dimensões, em todos os seus momentos, em todos os seus segundos. Para isso, eu não posso ter legislação social protetora do trabalho. Então, posso ter o trabalho terceirizado – eu fui praticamente o primeiro a dizer no Brasil, que a terceirização é uma forma de escravidão. Eu fazia a seguinte metáfora: na escravidão o senhor de terras, de engenho, comprava de um outro comerciante, o traficante, um escravo ou uma escrava. No mundo moderno, a empresa aluga de outra empresa o trabalho de homens e mulheres. Na escravidão, eu compro, na terceirização, eu alugo. É claro que é uma metáfora, mas mostra a dependência. Diziam que a lei da terceirização era para legalizar a terceirização. A lei da terceirização é a burla da farsa. Querem dizer que agora é legal burlar porque a burla deixou de ser burla e passou a ser legal.

“A lógica do capital financeiro é gerar mais dinheiro, explorando a classe trabalhadora em
todas as suas dimensões, mas antes precisa eliminar a legislação social protetora do trabalho” (Imagem: Divulgação)

E as questões do trabalho intermitente?

As grandes corporações deram pulos no dia em que a reforma trabalhista passou, porque esses grandes grupos podem contratar no dia de pico, nos dias de maior movimento, sábado, domingo, à noite, e contratam os trabalhadores que ficam esperando. Tem trabalho, são chamados. Se ele vai para um almoço das 11h às 15h e depois sabe que tem que voltar das 18h às 22h ele fica direto na empresa, recebendo por trabalho intermitente. O que significa esse trabalho intermitente, esse trabalho flexível, esse trabalho, digamos, terceirizado? Ele só é possível não mais na planta rígida Taylorista e Fordista do passado, mas na planta flexível que inicia a era da acumulação flexível e aquilo que nós chamamos de Toyotismo que se ocidentalizou e ganhou novos componentes, adquirido a partir do Vale do Silício, da Califórnia. Ora, há fotografias hoje de trabalhadores do Vale do Silício que moram nas ruas ou nos carros para trabalhar porque não têm condições de pagar um apartamento, um quarto, uma pensão nessa área que é caríssima. E em compensação ele não quer perder esse emprego. Então ele coloca o carro lá, monta um banheiro e uma cozinha improvisados. Não é possível isso, não é possível…

Muito se fala de que os trabalhadores têm que se adaptar às novas ondas tecnológicas que cada vez mais impactam o mundo do trabalho. Parte da mão de obra que perde seu emprego por causa das novas tecnologias acaba sendo absorvida em outros campos da economia. E os que não conseguem se adaptar?

Miséria, fome, condição abjeta e desumana. É a Índia. Seguindo a lógica do mundo financeiro e nessa reestruturação permanente do capital nós vamos ter bolsões de miseráveis; os fluxos migratórios vão aumentar, norte-sul, sul-norte, leste-oeste, oeste-leste. As massas vão ficar desesperadas e vai ter que ter estados fascistas se fechando, fechando o trabalho.

Fonte: www.extraclasse.org.br/exclusivoweb/2018/07/digitalizacao-do-trabalho-e-a-escravidao-no-seculo-21/

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Rita, a professora e os milagres

26.07.2018

Marcos Rolim

Aos 44 anos, mãe de três filhos e solteira, ela não respeita as regras. É atraente e mantém uma vida sexual intensa, o que inclui encontros casuais em espaços públicos com diferentes parceiros

Rita, a defensora dos alunos. Sem ser santa (Foto: Divulgação/Netflix)

A TV como a conhecemos não existirá por muito tempo e a TV por demanda (TV on demand) talvez seja só um sintoma de mudanças mais radicais pela frente. Nesse ambiente de inovação, a experiência da Netflix se destaca e impressiona por vários aspectos. Um deles é a oferta de excelentes produções regionais europeias, latino-americanas e asiáticas, muito além dos enlatados norte-americanos que seguem sendo servidos em profusão pelos canais abertos e por assinatura. Nesse artigo, comento (sem spoilers) sobre a séria dinamarquesa Rita, que trata dos desafios da educação na escola pública.

Assim como em Merli (outra série bacana da Netflix), o tema de Rita é a escola, seus limites e possibilidades. Há, por óbvio, amplas diferenças culturais se tivermos em mente a realidade dos países nórdicos e a dos países latino-americanos, por exemplo, mas os conflitos abordados na série têm muito em comum com a realidade de qualquer escola no mundo e lidam com o que há de universal na agência humana. A Dinamarca é um pequeno país que construiu uma experiência notável de igualdade e democracia característica dos chamados Estados de Bem Estar Social (Welfare States), mas problemas como indisciplina, bullying, homofobia, gravidez na adolescência, uso de drogas e tráfico, inclusão de imigrantes, doença mental, entre outros, estão presentes em suas escolas. Como se pode observar na série, políticos demagogos e não comprometidos com o ensino público não são exclusividade brasileira e falta de recursos para a Educação e pais e mães negligentes ou superprotetores que produzem danos às crianças também são fenômenos presentes nos países mais desenvolvidos.

Rita (Mille Dinesen) é uma professora excepcional por conta de sua disposição de lutar por seus alunos. Aos 44 anos, mãe de três filhos e solteira, ela não respeita as regras. É atraente e mantém uma vida sexual intensa, o que inclui encontros casuais em espaços públicos com diferentes parceiros. Rita fuma e bebe muito – em um país onde há grande consumo de bebidas alcoólicas e grande incidência de tabagismo. Ela parece fazer pouco caso de si própria, mas sua dedicação e cuidado com os alunos são admiráveis. A rebeldia de Rita, entretanto, revela uma estrutura moral, não uma contestação diletante.

Para explicar isso, retomo Kohlberg (1927-1987) que identificou o processo de formação da consciência moral. Para ele, a infância seria marcada por uma “moralidade pré-convencional”, basicamente autocentrada e egoísta, onde há, primeiramente, uma orientação para a punição e a obediência e, depois, uma orientação hedonista. Na adolescência e na vida adulta, o nível de moralidade mais comum seria o “convencional”, onde se assume, inicialmente, uma postura de identificação com os valores do grupo e, depois uma conduta pela “Lei e a Ordem”. Nesse estágio, onde se situa a maioria dos adultos, a noção de justiça é marcada pela crença na “punição dos transgressores”. Haveria, entretanto, um nível superior de consciência moral, o da “moralidade pós-convencional”, onde se descobre que, sim, deve-se respeitar as leis, mas nem sempre as leis são justas e há circunstâncias em que é legítimo descumpri-las, o que vale também para a recusa de recebimento de vantagens legais, mas imorais. Nesse nível avançado do desenvolvimento moral, o estágio superior seria aquele em que o sujeito orienta suas ações pela validade de princípios universais. A ideia de desobediência civil, aliás, que pressupõe a decisão de submeter-se à punição pela inobservância de norma injusta, se funda nesta compreensão. Neste estágio de moralidade, o princípio proposto por Kant segundo o qual as pessoas devem ser concebidas como fins e nunca como meios seria, então, alcançado.

Rita tem um senso moral pós-convencional, por isso, é tão diferente, admirável, incompreendida e temida. Sua conduta, entretanto, a expõe sistematicamente, o que lhe agrega dissabores e sofrimentos, notadamente em suas relações pessoais.

Há, em vários episódios, momentos hilários e a atriz coadjuvante, Lise Baastrup, que faz a personagem Hjørdis, nos garante alguns deles com brilho. Ao mesmo tempo, o enredo vai delineando uma tessitura de relações sociais complexas, nas escolas e fora delas, alcançando uma densidade que cativa e estimula a reflexão. Rita é, sobretudo, uma professora engajada, que disputa seus alunos, notadamente aqueles cujos destinos lhe parecem ameaçados pelo mundo.

Talvez o que exista de melhor e de mais relevante na escola seja, exatamente, a possibilidade dela proteger crianças e adolescente da maldade do mundo. Hannah Arendt entendia que a Escola é o espaço intermediário entre o público e a vida privada das famílias. Para ela, não cabia à escola “ensinar a viver”, mas ensinar o que é o mundo, a partir do acesso ao patrimônio cultural construído pelas gerações passadas e pelo estímulo ao pensamento. Uma missão dessa gravidade exige muitas Ritas. São elas, afinal, que fazem com que o novo apareça sempre, como o disse Arendt, “sob o disfarce de um milagre”.

Fonte: https://www.extraclasse.org.br/edicoes/2018/07/rita-a-professora-e-os-milagres/

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Lei cria Política Nacional de Leitura e Escrita

20.07.2018

SenadoNotícias - Redação
  
O projeto de lei de autoria da senadora Fátima Bezerra (PT-RN), agora é a lei 13.696, publicada no Diário Oficial da União, na sexta-feira, 13/07, que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE). A nova legislação estabelece estratégias para contribuir para a universalização do direito ao acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas. Não houve nenhum veto.

Política Nacional de Leitura e Escrita entra em vigor (Foto: SenadoNotícias)

Em um primeiro momento, ainda no governo Lula, o primeiro passo rumo à institucionalidade foi em 2006, com uma portaria interministerial do Ministério da Cultura e MEC, assinadas pelos então ministros Gilberto Gil e Fernando Haddad. Já em 2011, a presidente Dilma Rousseff ampliou essa institucionalidade, ao assinar o decreto que instituiu o PNLL como estratégia permanente de planejamento, apoio, articulação e referência para a execução de ações voltadas para o fomento da leitura no Brasil. O Plano estabelece quatro eixos estratégicos: (1) Democratização do acesso, (2) Fomento à leitura e à formação de mediadores; (3) Valorização institucional da leitura e do seu valor simbólico e (4) Fomento à cadeia criativa e à cadeia produtiva do livro.

Segundo a lei agora aprovada, o Estado brasileiro se compromete, a cada dez anos, criar um novo Plano traçando e estabelecendo metas e ações para o livro, leitura, literatura e bibliotecas no País. A Lei tem ainda em seu bojo o objetivo de fortalecer o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, promovendo as demais políticas de estímulo à leitura, ao conhecimento, às tecnologias e ao desenvolvimento educacional, cultural e social do País, entre outros objetivos.

“Foi uma vitória extraordinária”, comemorou Fátima Bezerra, que liderou várias iniciativas para apoiar as políticas do livro e da leitura e conseguiu uma tramitação bastante rápida no Congresso: dois anos e dois meses desde a sua chegada até o autógrafo presidencial. Segundo ela, será um instrumento importante para fazer o País avançar na implementação de políticas públicas que democratizem o acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas.


Principais aspectos

Institui a Política Nacional de Leitura e Escrita como estratégia permanente para promover o livro, a leitura, a escrita, a literatura e as bibliotecas de acesso público no Brasil.

Implementação - A Política Nacional de Leitura e Escrita será implementada pela União, por intermédio do Ministério da Cultura e do Ministério da Educação, em cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e com a participação da sociedade civil e de instituições privadas.

Regulamentação - Ato conjunto do Ministério da Cultura e do Ministério da Educação regulamentará o disposto nesta Lei.

Plano Nacional - Para a consecução dos objetivos da Política Nacional de Leitura e Escrita, será elaborado, a cada decênio, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), que estabelecerá metas e ações, nos termos de regulamento:

·    Prazo: Será elaborado nos 6 primeiros meses de mandato do chefe do Poder Executivo, com vigência para o decênio seguinte.

·    Competência: Será elaborado em conjunto pelo Ministério da Cultura e pelo Ministério da Educação de forma participativa, assegurada a manifestação do Conselho Nacional de Educação (CNE), do Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC) e de representantes de secretarias estaduais, distritais e municipais de cultura e de educação, da sociedade civil e do setor privado.

·    Acessibilidade: Deverá viabilizar a inclusão de pessoas com deficiência, observadas as condições de acessibilidade e o disposto em acordos, convenções e tratados internacionais que visem a facilitar o acesso de pessoas com deficiência a obras literárias.

Planos estruturantes - A Política Nacional de Leitura e Escrita observará, no que couber, princípios e diretrizes de planos nacionais estruturantes, especialmente do:

·    Plano Nacional de Educação (PNE);

·    Plano Nacional de Cultura (PNC);

·    Plano Plurianual da União (PPA).

Lei regulamenta o acesso à leitura (Foto: SenadoNotícias)

Objetivos - São objetivos da Política Nacional de Leitura e Escrita:

·    Ampliação de acervos físicos e digitais: Democratizar o acesso ao livro e aos diversos suportes à leitura por meio de bibliotecas de acesso público, entre outros espaços de incentivo à leitura, de forma a ampliar os acervos físicos e digitais e as condições de acessibilidade;

·    Formação continuada: Fomentar a formação de mediadores de leitura e fortalecer ações de estímulo à leitura, por meio da formação continuada em práticas de leitura para professores, bibliotecários e agentes de leitura, entre outros agentes educativos, culturais e sociais;

·    Campanhas: Valorizar a leitura e o incremento de seu valor simbólico e institucional por meio de campanhas, premiações e eventos de difusão cultural do livro, da leitura, da literatura e das bibliotecas;

·    Aquisição de acervos, feiras e eventos: Desenvolver a economia do livro como estímulo à produção intelectual e ao fortalecimento da economia nacional, por meio de ações de incentivo ao mercado editorial e livreiro, às feiras de livros, aos eventos literários e à aquisição de acervos físicos e digitais para bibliotecas de acesso público;

·    Pesquisa e Intercâmbio: Promover a literatura, as humanidades e o fomento aos processos de criação, formação, pesquisa, difusão e intercâmbio literário e acadêmico em território nacional e no exterior, para autores e escritores, por meio de prêmios, intercâmbios e bolsas, entre outros mecanismos;

·    Qualificação das bibliotecas: Fortalecer institucionalmente as bibliotecas de acesso público, com qualificação de espaços, acervos, mobiliários, equipamentos, programação cultural, atividades pedagógicas, extensão comunitária, incentivo à leitura, capacitação de pessoal, digitalização de acervos, empréstimos digitais, entre outras ações;

·    Indicadores e estatísticas: Incentivar pesquisas, estudos e o estabelecimento de indicadores relativos ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas, com vistas a fomentar a produção de conhecimento e de estatísticas como instrumentos de avaliação e qualificação das políticas públicas do setor;

·    Capacitação: Promover a formação profissional no âmbito das cadeias criativa e produtiva do livro e mediadora da leitura, por meio de ações de qualificação e capacitação sistemáticas e contínuas;

·    Planos Locais: Incentivar a criação e a implantação de planos estaduais, distrital e municipais do livro e da leitura, em fortalecimento ao SNC; e

·    Ações educativas: Incentivar a expansão das capacidades de criação cultural e de compreensão leitora, por meio do fortalecimento de ações educativas e culturais focadas no desenvolvimento das competências de produção e interpretação de textos.

Diretrizes | São diretrizes da Política Nacional de Leitura e Escrita:

·    A universalização do direito ao acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas;

·    O reconhecimento da leitura e da escrita como um direito, a fim de possibilitar a todos, inclusive por meio de políticas de estímulo à leitura, as condições para exercer plenamente a cidadania, para viver uma vida digna e para contribuir com a construção de uma sociedade mais justa;

·    O fortalecimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), no âmbito do Sistema Nacional de Cultura (SNC);

·    A articulação com as demais políticas de estímulo à leitura, ao conhecimento, às tecnologias e ao desenvolvimento educacional, cultural e social do País, especialmente com a Política Nacional do Livro, instituída pela Lei nº 10.753/03;

·    O reconhecimento das cadeias criativa, produtiva, distributiva e mediadora do livro, da leitura, da escrita, da literatura e das bibliotecas como integrantes fundamentais e dinamizadoras da economia criativa.

·    Prêmio - Cria também o Prêmio Viva Leitura, que será concedido no âmbito da Política Nacional de Leitura e Escrita com o objetivo de estimular, fomentar e reconhecer as melhores experiências que promovam o livro, a leitura, a escrita, a literatura e as bibliotecas, nos termos de regulamento.

Esta Lei entra em vigor em  13/07 na data de sua publicação.

Fonte: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2018/07/13/lei-cria-politica-nacional-de-leitura-e-escrita

Governo português estuda uso de tablets em vez de livros

06.07.2018

Redação

Talvez num futuro próximo os livros possam ser substituídos por tablets: “Vamos ver, mas por que não? Acho que é de pensar porque, se outros fazem e é bom, porventura adaptando à Região, pode ser uma boa resposta. É uma questão que vamos considerar e, se entendermos que pode ser útil, porque não?”. Foi desta forma que o diretor regional de Educação mostrou estar disponível para estudar a substituição dos manuais pela introdução de meios tecnológicos, nomeadamente tablets, de resto como já acontece nalguns países do Norte da Europa, designadamente na Finlândia, país que tem sido um exemplo no sistema de educação mundial e uma forma de respeitar as recomendações aprovadas pela Assembleia da República e pela Assembleia Legislativa, sobre o peso das mochilas que os alunos transportam.


Governo português avalia uso de tablets (Foto: arquivo)

O governante falava esta tarde à margem do Encontro Regional da 4ª Edição do Apps for Good, que decorreu na Ribeira Brava e onde três equipes de jovens entre os 10 e os 18 anos participaram e demonstraram o trabalho desenvolvido ao longo do ano lectivo, aproveitando para apresentar as suas ideias (Apps) que solucionam problemas reais.

Marco Gomes diz ser intenção da tutela que “as utilizem as ferramentas de programas tecnológico, de uma forma generalizada, uma ferramenta que desenvolvam os seus projetos (...) por aquilo que temos visto, achamos que vai ter muita aceitação e que possa resultar respostas ao dia-a-dia”.

Fonte: http://www.dnoticias.pt/madeira/governo-estuda-tablets-em-vez-de-livros-FI3381214

Software desenvolvido em Coimbra avalia o desempenho de leitura das crianças

20.07.2018

Redação 

Aprender e aperfeiçoar o “bê-á-bá” da leitura dos alunos do ensino básico conta, agora, com uma ajuda adicional. O software Toca-a-Ler – desenvolvido pelo Instituto de Telecomunicações (IT), polo de Coimbra – assume-se como uma tecnologia que avalia a capacidade de leitura dos alunos do primeiro ciclo do ensino básico, potenciando a melhoria contínua no desempenho da tarefa.

A ferramenta, desenvolvida em parceria com a Microsoft e com a Universidade de Coimbra, funciona através de um sistema de reconhecimento de fala, previamente treinado com crianças e adaptado para a classificação da pronúncia, considerando as metas curriculares da disciplina de Português como, por exemplo, a avaliação do número de palavras corretamente pronunciadas por minuto.

Software Toca-a-Ler (foto: arquivo)

De forma a obter uma referência de cálculo para o desempenho de leitura, a equipa de investigação, coordenada por Fernando Perdigão – docente da Universidade de Coimbra e investigador do IT –, recolheu centenas de horas de gravações de crianças a ler frases e pseudopalavras, de forma idêntica à pretendida pelo sistema de avaliação e, reuniu, ainda, a avaliação de mais de 100 professores do ensino básico.

Desta forma, o software avalia a capacidade de leitura, identificando as disfluências e o tempo de leitura dos alunos, possibilitando, assim, a avaliação objetiva do desempenho da tarefa. O sistema insere-se no projeto de investigação “LetsRead”, em desenvolvimento desde 2016, e está disponível online.

Fonte: Echo Boomer

Cercado por livros

20.07.2018

Ramon Ribeiro 

Se tem uma área que o senhor José Xavier Cortez conhece bem essa área é a dos livros. Ele se dedica ao mercado livreiro desde os tempos que cursava Economia na PUC-SP e vendia livros para os colegas de classe até os dias de hoje, quando, aos 82 anos, segue à frente da Editora Cortez, fundada por ele em 1980. Nascido no Sítio Santa Rita, na zona rural de Currais Novos, Cortez construiu toda sua história como livreiro e editor em São Paulo, mas nunca deixou de visitar sua terra de origem.

José Xavier Cortez fala de sua trajetória como editor (foto: arquivo)

Fundador da Editora Cortez, o curraisnovense José Xavier Cortez está de férias pelo Rio Grande do Norte. Ele construiu sua vida como livreiro e editor em São Paulo, mas nunca deixou de visitar sua terra Natal, o Sítio Santa Rita, na zona rural de Currais NovosDe férias no Rio Grande do Norte, um de seus primeiros pontos de parada foi o centenário sítio da família. “Estive lá semana passada. Fui com minhas filhas e netos. Quis mostrar para os netinhos onde cresci. Fizemos uma festa de São João lá”, conta o editor.

Cortez também aproveitou a ida a Currais Novos para dar uma esticadinha no município vizinho, Lagoa Nova, e fazer uma das coisas que mais gosta, que é palestrar sobre a importância da leitura. “Desde que sai de casa a leitura passou a fazer parte do meu cotidiano. A leitura me levou a ser o que sou hoje”.

Nesta entrevista a TRIBUNA DO NORTE Cortez conversou um pouco sobre sua área, a dos livros, e sua terra, o Sítio Novo. Lembrou os passos que o levaram a entrar no mercado livreiro, contou de como deu um drible na censura durante a Ditadura Militar e também falou sobre as dificuldades enfrentadas pelas editoras brasileiras nos dias atuais. Sítio Santa Rita Sou nascido e criado no sertão do Seridó, no Sítio Santa Rita, distante 25 km do centro de Currais Novos. Esse sítio foi deixado pelo meu avô aos meus pais.

Fui criado no cabo da enxada, plantando milho, feijão. Era um trabalho duro lá e ainda tínhamos que ir para escola rural, onde aprendi a carta do ABC. No meu tempo não tinha biblioteca, não tinha livro, o método de ensino ainda era arcaico. A vida no sertão, com a seca, é muito difícil, principalmente para uma família com mais de 10 filhos como a nossa. Percebi que aquela terra não ia se multiplicar então quando completei 17 anos fui para Natal.

Passagem pela Marinha - Quando fiz 18 anos, servi na Marinha. Fiquei de 1955 até 1964, quando me expulsaram por questões políticas. Eu já estava morando no Rio de Janeiro, mas me mudei para São Paulo. Sai da roça, fui maquinista na Marinha, mas em São Paulo eu não tinha como trabalhar com nada disso. Comecei do zero trabalhando como lavador de carros num estacionamento. Até que em 1966 consegui entrar no curso de Economia da PUC-SP. Foi quando a minha vida mudou completamente. Vender livro na faculdade Na época da PUC eu morava do lado de uma editora de livros acadêmicos. Aproveitei para revender algumas obras para os meus colegas de classe.

Com o tempo a venda de livros estava me oferecendo condições financeiras melhores do que a que tinha numa empresa em que estava trabalhando (uma revendedora de peças de automóveis). Então passei a me dedicar inteiramente a venda de livros. Meu nome ficou conhecido na universidade, passei a ser procurado por estudantes e professores. Até que em 1968, fundei a livraria Cortez. A trajetória de livreiro até editor eu fiz sem conhecimento de mercado. Fui aprendendo na prática, abraçando as oportunidades que surgiam. Por exemplo, eu tinha um contato que me permitia trazer para o país livros proibidos pela Ditadura. As pessoas me viam com confiança, principalmente os professores. Nessa época, a PUC-SP era um dos espaços de resistência, abrigava intelectuais que combatiam o golpe, como Paulo Freire e Florestan Fernandes.

Esse período teve uma importância muito grande na abertura da livraria e da editora, definindo nossa linha editorial. Foco nas discussões contemporâneas Em 1980 eu começo a editora. As primeiras publicações foram de teses de mestrado e doutorado, em sua maioria de abordagens que divergiam do sistema da época. Até hoje mantemos essa linha progressista. É um perfil que não abdico. Sempre buscamos debater as grandes questões nacionais.

É importante ressaltar nesse nosso começo da editora que os professores foram os grandes responsáveis pelo meu amadurecimento na área. Eles participavam de conferências pelo país e levavam os livros. Driblando a censura Eu tinha medo da ditadura, mas nunca fui pego. Pra você ter uma ideia, eu não comentava que tinha passado pela Marinha. Me preocupava com dedo-duros, que alguém me caguetasse. Mas nunca cheguei a ter problemas com os Militares. O mais perto disso foi com a publicação de um livro de um autor argentino. O livro se chamava “Servicio Social Pueblo”. Quando estava indo pra gráfica, saiu na imprensa que a obra estava proibida. Mas demos um jeito. Tiramos a palavra povo do título, que era o que assustava as autoridades, e publicamos do mesmo jeito, sem os censores perceberem. Publicamos com o nome “Sete Estudos Sobre Serviço Social”. Foi bastante lido nos anos 70 e 80.

As dificuldades de manter uma editora De 2015 pra cá o mercado livreiro teve um baque muito grande. Pra você ter uma ideia, em 2014 a gente tinha 70 funcionários, hoje são apenas 30. As pequenas livrarias desapareceram. A nossa, fechamos em 2016. Ficamos só com a editora. Não tínhamos condições de sobreviver num mercado tão especulativo, com domínio das grandes redes que pedem descontos exorbitantes. Os governos, em todos os níveis, não compram mais livros. O papel tem o processo tabelado, definido por poucas empresas que dominam essa área. Outro problema são os atrasos no pagamento, que afeta toda a cadeia. O fato é que existe uma anomalia no mercado livreiro, e isso existe em detrimento da cultura nacional.

Educação é prioridade para o crescimento de qualquer pessoa. Livro não é custo. É investimento. Mas não é feito nada para mudar esse cenário. Raízes seridoenses Eu sempre visito o sítio da família. É muito bom poder conviver com as nossas origens. Quando vou no sítio me conecto com meu passado, encontro colegas que estudaram comigo na escola. Eu tenho a preocupação de que poderia estar melhor. Ainda há muitos analfabetos, muita ignorância. Mas eu nunca deixei de acreditar da força transformadora dos livros. Como eu sempre digo nas minhas rodas de conversa, desde que sai de casa a leitura passou a fazer parte do meu cotidiano. E foi ela que me levou a ser o que sou hoje.

Fonte: http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/cercado-por-livros/417831

quarta-feira, 11 de julho de 2018

Por que Lula já ganhou?

11.07.2018

Juan Árias

A tragicomédia judicial do domingo serviu para deixar mais a descoberto a fragilidade de
todo o sistema jurídico brasileiro, que ameaça contagiar o restante das instituições


Lula discursa no Fórum Social Mundial de Salvador (BA) em março deste ano (Lucio Tavora/AFP)

O dia 8 de julho, foi apelidado de “domingo da loucura judicial”. E é possível que seja lembrado como a data em que Lula ganhou uma batalha maior que a de sua libertação. Graças a tudo o que se mobilizou em torno de sua luta judicial, cuja condenação em segunda instância o impede de disputar as eleições presidenciais apesar de estar à frente nas pesquisas, o Brasil descobriu que seu sistema judicial está podre.

Foi a importância da figura política e mítica de Lula posta em discussão o que levou toda a cadeia jurídica, da primeira instância ao Supremo, a descobrir a urgência de uma reforma que não pode esperar mais, sob pena de uma convulsão social. Lula continua na prisão e é possível que novas condenação caiam sobre sua cabeça, embora ninguém seja capaz de profetizar seu futuro. O que é certo mesmo é que Lula, inocente ou culpado, fez ver que o rei supremo da Justiça está nu. Foi ele quem atiçou o fogo, e os ratos, que sempre existiram, começaram a sair de suas tocas.

Não foi um simples plantonista, entre ingênuo e malicioso, que provocou a tempestade, com seu desejo de não ficar atrás na corrida de egos que atravessa, por exemplo o Supremo. Se Dias Toffoli, por sua conta e risco, com uma decisão monocrática que contradizia a do colegiado do Supremo, tirou da prisão José Dirceu, condenado a 30 anos, por que ele não poderia libertar Lula?

A tragicomédia judicial do domingo serviu para deixar mais a descoberto, se possível, a fragilidade de todo o sistema jurídico brasileiro que ameaça contagiar o restante das instituições. O caso Lula poderá um dia ser estudado como o revulsivo que revelou que não dá mais para esperar a reforma da Justiça, a começar pelo Supremo, cada vez mais se revelando, com o espetáculo pouco exemplar do protagonismo dos altos magistrados, o ponto crucial de toda a insegurança política e até social que agita o Brasil.

Já não resta dúvida de que o espetáculo oferecido pelos ministros da alta corte chegou ao ápice. A guerra de egos entre os 11 juízes supremos é evidente até para os analfabetos do país. Hoje magistrados como Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Barroso e Carmem Lucia são mais protagonistas em nível popular que muitos atores das novelas, o que é uma aberração democrática.

Ou o Brasil recompõe a legalidade jurídica ou a crise política já em curso com ameaças de volta aos tempos obscuros do autoritarismo acabará se agravando. É nas águas da insegurança jurídica que melhor se reproduzem as bactérias de todos os totalitarismos.

Uma das tarefas mais urgentes do novo presidente da República será pôr ordem nos tribunais e mudar um Supremo que parece estar agindo mais na pequena política partidária do que na defesa da Constituição. É urgente uma reforma profunda da instituição que deveria ser a coluna mestra das demais instituições. É urgente renovar o sistema de escolha dos magistrados para que não acabem sendo meros seguidores de quem os nomeou. É urgente despojar o Supremo das funções meramente judiciais que o levam às vezes ao limite do ridículo, tendo que julgar um habeas corpus de um condenado por ter roubado um par de tênis usados. É urgente retirar-lhes a vaidade de que votos intermináveis e crípticos sejam televisionados. Se por um lado isso pode ser visto como uma abertura democrática, acaba sendo um caldo de cultura da vaidade dos togados.

É possível que sem o caso Lula, que ainda não sabemos como será resolvido pessoalmente, os reis do Supremo seguissem protegidos pela reverência de suas togas capazes de ocultar pequenas e mesquinhas misérias que acabam envenenando não só a política, como também a confiança na Justiça. Lula, embora através do paradoxo de sua condenação, está servindo para que todo o Brasil, dada a notoriedade de seu caso penal, esteja descobrindo que a deusa grega da justiça está arrancando a venda de seus olhos ficando livre para tentações inconfessáveis.

Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/07/09/opinion/1531154643_668674.html

A disputa que decide

12.07.2018

Janio de Freitas

Os votos que vão decidir são os dos 11 ministros do STF e os dos 33 do STJ. A eleição presidencial está disputada, e será decidida, entre o pré-candidato que, apesar de único a não estar em campanha, detém descansada preferência do eleitorado, e de outra parte o combinado STF-STJ. Acima da divergência em aspectos jurídicos, os termos dessa disputa lançam uma interrogação sobre a legitimidade do seu resultado como representação eleitoral democrática.

O eleitorado reúne cerca de 150 milhões de cidadãos, mas os votos que vão decidir a disputa central são os de 11 ministros do Supremo Tribunal Federal e 33 do Superior Tribunal de Justiça, aos quais caberá a palavra final sobre a possibilidade de que a pré-candidatura preferida nas pesquisas busque sê-lo também nas urnas.

O ex-Presidente Lula, pré-candidato às eleições de 2018

As condições vigentes há meses são claras na indicação de que o problema de legitimidade do resultado eleitoral é secundário, ou nem se apresenta, nas considerações do Judiciário ocupado com o enlace condenação-prisão-candidatura.

A marcha rumo ao objetivo judicial, ou assim invocado, não desacelerou nem diante de regras também judiciais, superando-as sob a observação cúmplice dos que condenam cúmplices. Marcha batida até chegar ao segundo êxito, consumado no encarceramento com dupla significação: como ato judicial e, por consequência, como ato político-eleitoral.

Em tais circunstâncias, o pedido e a concessão de habeas corpus só podem ser vistos como atitudes impensadas em favor de Lula. Não caberia a mais leve dúvida de que o habeas corpus não daria ao preso mais do que algumas horas, se tanto, de liberdade relativa.

Os bem-sucedidos condenadores não tinham por que descuidar do seu êxito e tinham todos os meios, nas regras e fora, para devolver Lula à prisão. Usaram todos, e nem o deixaram chegar à porta.

Das seis pretensas razões citadas na concessão do habeas corpus, só uma tem potencial efeito. A autorização do Supremo para prisões já em condenação na segunda instância, e não no esgotamento constitucional dos recursos, condicionou-as à fundamentação da sua necessidade.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2018/07/a-disputa-que-decide.shtml

Wikileaks: EUA criou curso para treinar Moro e juristas

11.07.2018

Em documento interno do governo de Washington que foi vazado pelo Wikileaks, os EUA
mostram como treinaram agentes judiciais brasileiros, entre eles Sérgio Moro. O documento,
de 2009, pede para instalar treinamento aprofundado em Curitiba.
Alguma suspeita com a atualidade?

André Augusto*

O Wikileaks revelou o informe enviado ao Departamento de Estado de Estados Unidos do seminário de cooperação, realizado em outubro de 2009, com a presença de membros seletos da Polícia Federal, Judiciário, Ministério Público, e autoridades estadunidenses, no Rio de Janeiro. O Wikileaks é um site especializado por vazar documentos internos do governo estadunidense.

Delegação brasileira, com a presença de Sérgio Fernando Moro, era a maior, que contava
com participantes do México, Costa Rica, Panamá, Argentina, Uruguai e Paraguai

O seminário se chamava “Projeto Pontes: construindo pontes para a aplicação da lei no Brasil”, em que se tratava de consolidar treinamento bilateral de aplicação das leis e habilidades práticas de contraterrorismo. Promotores e juízes federais dos 26 estados brasileiros participaram do treinamento, além de 50 policiais federais de todo o país. A delegação tupiniquim era a maior dentre os participantes, que contava com participantes do México, Costa Rica, Panamá, Argentina, Uruguai e Paraguai.

O memorando relata o “grande entusiasmo” com que os promotores e juízes federais brasileiros se dissiparam dos temores que o termo “contraterrorismo” desperta em amplos setores – nada mais nada menos o novo discurso com que George W. Bush buscava revestir o direito inalienável do imperialismo estadunidense como “polícia do mundo”, depois da queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria com a restauração capitalista na ex-União Soviética, e que fundamentou intervenções militares em todo o Oriente Médio na década de 2000 e a reacionária intervenção estadunidense para frear as primaveras árabes de 2011.

Vê-se perfeitamente a intimidade com que a casta jurídica brasileira trata os termos do chefe imperial.

Vai senão quando, e meio ao informe para o Departamento de Estado, entra relato de ninguém menos que Sérgio Moro, que discorre sobre os “cinco pontos mais comuns acerca da lavagem de dinheiro no Brasil”. Sem detalhes particulares sobre a exposição do chefe da “República de Curitiba”, o informe mostra que houve acalorados debates em que a equipe de treinamento ianque, virtuosos na patifaria, ensinam os pupilos brasileiros e estrangeiros os segredos da “investigação e punição nos casos de lavagem de dinheiro, incluindo a cooperação formal e informal entre os países, confisco de bens, métodos para extrair provas, negociação de delações, uso de exame como ferramenta, e sugestões de como lidar com Organizações Não Governamentais (ONGs) suspeitas de serem usadas para financiamento ilícito”.

Na seção “Resultados”, o informe da equipe lembra a harmonia que se estabelece quando o tutor dedicado se depara com o aprendiz atento. Lê-se que “os participantes requisitaram treinamento adicional, sobre a coleta de evidências, entrevistas e interrogatório, habilidades usadas nos tribunais”. Este interesse subserviente se explicaria pelo fato de que  a democracia brasileira não alcança 20 anos de idade. Assim, os juízes federais, promotores e advogados brasileiros são iniciantes no processo democrático, não foram treinados em como lidar com longos processos judiciais […] e se encontram incapazes de utilizar eficazmente o novo código criminal que foi alterado completamente

Haveria que verificar a opinião dos participantes sobre esta cortês acusação de estupidez por parte dos chefes ianques. Se damos crédito ao informe, aos juristas e promotores brasileiros pouco importava a desconsideração vinda do norte, contanto que “consentissem em ensinar as novas ferramentas, que estão ansiosos em aprender”. Duas metades se completavam. Como dizia o russo Tchernichevsky, um fósforo é frio, assim como o lado de fora da caixa em que é riscado, mas juntos produzem o fogo que aquece a humanidade. Essa é a síntese das relações entre os Estados Unidos e o Poder Judiciário brasileiro.

E para completar a trama atual se desenvolvendo em determinada passagem do documento o informe pede para ministrar cursos mais aprofundados nos seguintes locais: Curitiba, São Paulo e Campo Grande. É de estranhar agora os procedimentos dá chamada “República de Curitiba”?

O relatório se conclui com a ideia de que “o setor judiciário brasileiro claramente está muito interessado na luta contra o terrorismo, mas precisa de ferramentas e treinamento para empenhar forças eficazmente. […] Promotores e juízes especializados conduziram no Brasil os casos mais significativos envolvendo corrupção de indivíduos de alto escalão”. Não admira que, durante estes últimos anos, a cooperação com os Estados Unidos, e mesmo sem ela, tenha incrementado o conhecimento do Judiciário e do Ministério Público acerca dos principais casos de corrupção no país.

Com tamanha rede de investigação, é possível acreditar que o Judiciário e a Polícia Federal não sabiam de nada no esquema da Petrobrás? Só descobriram agora? Parece inverídico. O próprio desespero de Moro nesta quarta-feira em colocar sob sigilo os mais de 300 nomes dos políticos envolvidos na delação da Odebrecht sinaliza que ela poderia traçar o rastro para pistas que envolvam membros proeminentes de outros poderes para além do Legislativo. Então, surge a pergunta: quem vai investigar a PF? Quem vai julgar os juízes?

A farsa das instituições democráticas

Seguramente a responsabilidade pelo fortalecimento da direita e das instituições autoritárias do Estado capitalista recaem sobre Lula, Dilma e o PT. Por outro lado, as manobras de Sérgio Moro e encampadas pelo Supremo Tribunal Federal representam a preparação de um “golpe institucional” deste Partido Judiciário, e devem ser denunciadas contundentemente.

Os juízes não são eleitos por ninguém. Pelo contrário, são escolhidos pelos donos do poder. Como muito, são funcionários de carreiras cheias de filtros sociais, para que seus cargos sejam ocupados só pela elite. Gozam dos mais altos privilégios da “república dos ricos”, alguns deles vitalícios. E entretém todo tipo de laços com o imperialismo e as potências estrangeiras, que se encontram documentadas em arquivos de estado como este.

É lamentável a posição da esquerda, como PSOL e PSTU que se alinham atrás da superstição da Lava Jato e de que Moro pode revolver o dolo da corrupção burguesa, ou revestidos da política de “Fora Todos” e “Eleições Gerais”, uma verborragia que termina representando a política de impeachment da direita, quando é necessário unir forças para exigir das direções burocráticas que rompam sua colaboração com o governo e encabecem uma luta séria contra os ajustes e a impunidade.

É preciso questionar todos os privilégios do Poder Judiciário, exigir que cada juiz seja eleito por sufrágio universal e seja revogável, perdendo suas verbas de auxílio e exigindo que recebam o mesmo salário de uma professora. Nem o PT, que fortaleceu esta instituição durante todos os seus governos, nem a direita reacionária do PMDB e do PSDB, podem fazer isso. É necessário que a população, em base a um movimento nacional contra os ajustes e a impunidade, impulsione uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana que imponha estas medidas, decidindo a revogabilidade de todos os mandatos, que todos os funcionários do Estado recebam o mesmo que uma professora, e que se revertam todos os acordos com o capital estrangeiro.

Veja abaixo a primeira página do informe vazado, o link do arquivo completo encontra-se no fim deste artigo.

Ver o informe em https://wikileaks.org/plusd/cables/09BRASILIA1282_a.html

Fonte: http://www.esquerdadiario.com.br/Wikileaks-EUA-criou-curso-para-treinar-Moro-e-juristas

Fonte: http://operamundi.uol.com.br/dialogosdosul/wikileaks-eua-criou-curso-para-treinar-moro-e-juristas/15072017/

México derrotou a mentira do “fim do ciclo progressista”, dizem especialistas

11.07.2018

O contundente triunfo do candidato do Movimento de Regeneração Nacional (Morena),
Andrés Manuel López Obrador, nas eleições presidenciais do México renovou
as esperanças do progressismo e da esquerda de toda a América Latina.

Hector Bernardo, no Contexto

Na década de 1990, depois da queda da União Soviética, a direita, através de seus braços mediáticos e seus “falsos profetas”, buscou impor a ideia de “fim da história”. Os povos da América Latina, com o ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez (1999-2013) na liderança, foram os primeiros a derrubar essa mentira. Agora, depois da interrupção de alguns processos populares da região, a direita neoliberal voltou a arremeter com a intenção de instalar a ideia de “fim do ciclo progressista” na América Latina. Com a vitória de López Obrador, o povo mexicano, e de todo o continente, voltou a dizer: “a mentira se acabou”.

Para entender a importância que tem para toda a América Latina o triunfo do candidato do Morena no México, o site Contexto dialogou com três especialistas: o filósofo mexicano Fernando Buen Abad, a jornalista e analista internacional Stella Calloni e o sociólogo argentino e especialista em geopolítica Atilio Boron.

Boron explicou que “o triunfo de López Obrador é a confirmação de que o famoso ‘fim do ciclo progressista’ não existe. Um candidato progressista impõe-se na segunda economia mais importante da América Latina, em um país que tinha 30 anos de aplicação das políticas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Políticas que fizeram com que hoje mais de 50% da população mexicana se encontre abaixo da linha da pobreza”.

“Pela primeira vez, rompe-se a tradicional disputa entre o PRI [Partido Revolucionário Institucional] e o PAN [Partido da Ação Nacional] [os dois partidos tradicionais do México], que são expressões da centro-direita e da direita. Além disso, esta ruptura do bipartidarismo se dá pelas mãos de um candidato que vai ter uma influência positiva sobre toda a América Latina”, afirmou.

Por último, Boron sustentou que “López Obrador é a demonstração para toda a América Latina de que o projeto da direita está bem longe de se consolidar e que, muito pelo contrário, os projetos progressistas, longe ter acabado, ainda têm muito o que dizer”.

López Obrador durante a campanha | Foto: Divulgação/ Facebook

Por sua vez, Fernando Buen Abad ressaltou que “uma vez mais os povos são capazes de nos ensinar grandes lições. Ao contrário do que dizem alguns sobre esse suposto ‘fim de ciclo’ e daqueles que, com certo derrotismo, só sabem ver o avanço da direita, os povos demonstram que têm sua maneira de contar a história e de fazê-la”.

“Esse é o aspecto mais destacável da experiência eleitoral de México, uma experiência que tem sido cozinhada longamente, que não é objeto de nenhuma improvisação. Para alguns, este triunfo pode ser uma grande surpresa, mas os que vêm seguindo o que acontece no México sabem que este triunfo é produto de um trabalho de décadas, é produto também de uma conjuntura e de um programa. Todo isso põe em evidência que não há nenhum ‘fim de ciclo’. Isto que o México vive hoje entusiasma todos os povos de América Latina”, ressalta o filósofo.

“Há muitos analistas que não entendem que os povos escrevem sua história pela força da luta, pela força da construção de sua própria linguagem. Isso foi o que aconteceu no México para que pudesse se concretizar o triunfo de López Obrador”, afirmou Buen Abad.

Na mesma linha, Stella Calloni assinalou que “o triunfo de López Obrador é um fato histórico. Além de ganhar a presidência, ganhou a maioria dos deputados e senadores e, pela primeira vez, o PRI ficou em terceiro lugar. López Obrador é um homem de esquerda, um progressista, um homem muito preparado, um estadista com muita experiência. Há que lembrar que quando esteve à frente da Prefeitura do México, como chefe de Governo do Distrito Federal, foi considerado por veículos europeus como o melhor prefeito do mundo e quando deixou a prefeitura o fez com 85% de imagem positiva”.

“López Obrador caminhou por todo México quase sem recursos, esteve intimamente com o povo. Este triunfo é o fruto de um trabalho impressionante de um homem que em suas atitudes se parece muito com Evo Morales”, ressaltou a jornalista.

Por último, Calloni destacou que “o triunfo de López Obrador demonstrou que os povos em movimento são capazes de derrotar a guerra mediática e psicológica imposta pela direita. Por isso, é um sinal de esperança e um símbolo para toda a América Latina”.

Fonte: http://operamundi.uol.com.br/dialogosdosul/mexico-derrotou-a-mentira-do-fim-do-ciclo-progressista-dizem-especialistas/11072018/

Não as matem

11.07.2018

Redação Brasil de Fato

Homenageado da Flip, Lima Barreto escreveu crônica contra o feminicídio em 1915.
O texto "Não as matem" é parte da obra Vida Urbana, uma coletânea do autor publicada em 1953.
Criador de uma das obras mais inovadoras e plurais, o escritor carioca será tema da 15ª Flip
São Paulo – "Não há muito tempo, em dias de carnaval, um rapaz atirou sobre a ex-noiva, lá pelas bandas do Estácio, matando-se em seguida. A moça com a bala na espinha, veio morrer, dias após, entre sofrimentos atrozes".


Esse trecho é de uma crônica de 1915 escrita por Lima Barreto, o homenageado na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) deste ano, provando que feminicídio não é um problema dos nossos tempos. O texto "Não as matem" é parte da publicação "Vida Urbana", uma coletânea de crônicas e artigos do autor publicada em 1953. 

Confira a íntegra:

Não as matem

Esse rapaz que, em Deodoro, quis matar a ex-noiva e suicidou-se em seguida, é um sintoma da revivescência de um sentimento que parecia ter morrido no coração dos homens: o domínio, quando même, sobre a mulher.

O caso não é único. Não há muito tempo, em dias de carnaval, um rapaz atirou sobre a ex-noiva, lá pelas bandas do Estácio, matando-se em seguida. A moça com a bala na espinha, veio morrer, dias após, entre sofrimentos atrozes.

Um outro, também, pelo carnaval, ali pelas bandas do ex-futuro Hotel Monumental, que substituiu com montões de pedras o vetusto Convento da Ajuda, alvejou a sua ex-noiva e matou-a.

Todos esses senhores parece que não sabem o que é a vontade dos outros.

Eles se julgam com o direito de impor o seu amor ou o seu desejo a quem não os quer. Não sei se se julgam muito diferentes dos ladrões à mão armada; mas o certo é que estes não nos arrebatam senão o dinheiro, enquanto esses tais noivos assassinos querem tudo que é de mais sagrado em outro ente, de pistola na mão.

O ladrão ainda nos deixa com vida, se lhe passamos o dinheiro; os tais passionais, porém, nem estabelecem a alternativa: a bolsa ou a vida. Eles, não; matam logo.

Nós já tínhamos os maridos que matavam as esposas adúlteras; agora temos os noivos que matam as ex-noivas.

De resto, semelhantes cidadãos são idiotas. É de supor que, quem quer casar, deseje que a sua futura mulher venha para o tálamo conjugal com a máxima liberdade, com a melhor boa-vontade, sem coação de espécie alguma, com ardor até, com ânsia e grandes desejos; como e então que se castigam as moças que confessam não sentir mais pelos namorados amor ou coisa equivalente?

Todas as considerações que se possam fazer, tendentes a convencer os homens de que eles não têm sobre as mulheres domínio outro que não aquele que venha da afeição, não devem ser desprezadas.

Esse obsoleto domínio à valentona, do homem sobre a mulher, é coisa tão horrorosa, que enche de indignação.

O esquecimento de que elas são, como todos nós, sujeitas, a influências várias que fazem flutuar as suas inclinações, as suas amizades, os seus gostos, os seus amores, é coisa tão estúpida, que, só entre selvagens deve ter existido.

Todos os experimentadores e observadores dos fatos morais têm mostrado a inanidade de generalizar a eternidade do amor.

Pode existir, existe, mas, excepcionalmente; e exigi-la nas leis ou a cano de revólver, é um absurdo tão grande como querer impedir que o sol varie a hora do seu nascimento.

Deixem as mulheres amar à vontade.

Não as matem, pelo amor de Deus!

Edição: Camila Rodrigues da Silva

Fonte: http://www.redebrasilatual.com.br/entretenimento/2017/06/homenageado-da-flip-lima-barreto-escreveu-cronica-contra-o-feminicidio-em-1915

20 anos

11.07.2018

Rosélia Sousa Silva




Crianças lindas dormindo num quarto...
Ele exausto roncando no outro...
Foi herói do fogo o dia inteiro, mereceu uma massagem da primogênita
e adormeceu.
Eu aqui costurando na sala
ainda cumprindo mais um turno dos trabalhos de hoje.
Não temos dinheiro na poupança, mas amanhã vence um cheque!
Prisminha 2010 estacionado na garagem amarela...
E o que temos? Orgulho do que temos!
Saúde...
Filhos...
Casa...
Emprego...
Família...
Amigos!
Foram tantas conquistas. Vitórias. Bênçãos.
Permeadas pelos choros. Erros. Mágoas. Traumas...
Não sei se passam.
Antes de ontem brigamos 
Hoje recebi um beijo de bom dia
Chorei: misto de alívio e resquícios de dor.
Já estou calma novamente.
É assim: nos vem as dúvidas,
os medos,
o cansaço das mil tarefas,
das responsabilidades,
das cobranças,
da rotina,
do peso do que não conseguimos melhorar.
Será?
Acabei de levantar do meu costurar para procurar um antialérgico que ele está a
precisar.
É.
Na soma disso tudo,
repetido várias vezes,
sustentados pelo beijo de bom dia e pelo cuidar de cada dia...
lá se vão 20 anos que saía eu do colégio quando escutei alguém me chamar:
- Ei, me espera aí, deixa eu te acompanhar?