Caio Gomes Silveira
“Quero divulgar o respeito ao próximo e às pessoas. Deus criou a gente para se respeitar, se amar e respeitar todos com suas diferenças. Então, quero que, quando as pessoas lerem o meu livro, acabem percebendo que todos têm suas insatisfações, mas podem ser felizes". A afirmação é do jovem Lucas Zorzetto, de 27 anos, portador de síndrome de Asperger, forma leve de autismo. Lucas conseguiu superar suas dificuldades de se socializar e escreveu um livro inspirado justamente na amizade que conquistou com Sabrina Miranda, uma portadora de síndrome de Down, de 37 anos. O livro vai ser lançado no dia 6 de maio no Centro Cultural de Tatuí (SP). Para ele, ter escrito a obra e ter conquistado a amizade da Sabrina na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) foram momentos especiais.
“Quando cheguei à Apae a Sabrina foi receptiva e isso facilitou bastante fazer amizade com ela. Ela recebe todo mundo que chega muito bem e foi uma da primeiras pessoas que virou minha amiga. A amizade dela é bem importante para mim. E o livro foi inspirado nela e surgiu por conta da nossa amizade. Então, a nossa amizade e o livro são especiais”, afirma.
Em entrevista ao G1, o jovem contou que recebeu o diagnóstico da síndrome de Asperger em 2011 depois de anos que a família e os professores perceberam a falta de socialização na escola e tentavam achar a causa. No ano seguinte, em 2012, ele sofreu depressão após a morte de um tio. Foi então que os pais decidiram levá-lo para a Apae. Porém, o jovem afirma que tinha receio e preconceito de ir para a Associação.
“Eu tinha preconceito e receio de que o lugar era só para problemas mais elevados. Não sabia que há deficiência intelectual, que é o meu caso, e a deficiência mental, quando a pessoa precisa de mais cuidados. Muitos fantasiam ou tem um conceito antigo sobre essas instituições, mas os alunos têm uma capacidade brilhante. Eles superam seus limites e nos surpreendem”, afirma Lucas.
E foi na Apae que o jovem conquistou a amizade da Sabrina . “Fiz amizade com ela logo no primeiro dia. Nós participávamos juntos das aulas de artesanato que, por sinal, ela é bem talentosa”, conta.
Escrevendo o livro
Segundo Lucas, em uma das aulas Sabrina enviou uma carta para ele e o jovem quis retribuí-la. “Ela mandou a carta pra mim e quis retribuir. No dia que ia mandar a carta, resolvi enviar um texto que tinha feito sobre uma menina que tinha uma pedra no sapato e que estava nervosa com isso. Eu fui escrevendo a história, mas, quando terminei, percebi que tinha umas 50 folhas. Então, eu levei o material ao professor Pedro Couto, que organizou tudo. Depois ainda entreguei a redação para Sabrina”, conta.
Os professores o ajudaram a organizar o texto e fizeram a correção do livro, que ganhou o título “Uma viagem ao Mundo de Clara”. A personagem principal, segundo Lucas, é inspirada em Sabrina.
“O livro é uma história fictícia sobre uma menina com síndrome de Down chamada Clara e insatisfeita por sua condição. Mas ela encontra em sua vida outros personagens com outros tipos de descontentamentos e que mostram que todos têm problemas e defeitos. Escolhi o nome Clara justamente por remeter à luz”, explica.
Além de Sabrina, outros personagens foram inspirados em psicólogos, professores e também na faxineira da Apae. “Sueli é mãe da personagem principal e tem o mesmo nome da faxineira da escola. Escolhi fazer uma personagem inspirada nela porque ela tem muita experiência e transmite uma mensagem muito positiva para todos os alunos da Apae”, diz Lucas.
Segundo o jovem, seu principal objetivo é que o livro consiga quebrar barreiras. “Espero que o livro ‘abra cabeças’ e quebre barreiras. Espero que as pessoas mudem a sua visão sobre pessoas com deficiência, pois elas são muito capazes e merecem ser respeitas e amadas. Afinal, nós todos somos filhos de Deus”, reflete.
Para a amiga Sabrina Miranda, ser a inspiração do livro e ver a obra sendo publicada são motivos de alegria. "Estou muito feliz pelo Lucas. Já li o livro e gostei bastante. Vou participar do lançamento e tenho muito orgulho dele. O livro mostra que todo mundo é capaz, inclusive quem tem deficiência, síndrome de Down ou síndrome de Asperger", afirma.
O livro será lançado no dia 6 de maio no Centro Cultural de Tatuí, após três anos de procura por uma editora que aceitasse a ideia e a publicasse. “Preciso vender 300 livros para custear a edição, porque não tinha dinheiro para fazer a publicação. Minha mãe Maria Luiza Soares e meu pai Adilson Zorzetto me apoiaram muito nessa jornada. Sou muito grato também às minhas irmãs mais velhas Roberta e Flávia”, completa Zorzetto.
Lucas atualmente não faz mais acompanhamento na Apae, mas ainda recebe tratamento psicológico. Ele quer continuar escrevendo e diz que já tem até outro livro em produção. O jovem trabalha como auxiliar de produção em uma indústria eletro metalúrgica da cidade, onde Sabrina também trabalha, mas em outro setor de produção. A amizade dos dois ainda é mantida: "Ela é uma pessoa muito querida para mim", afirma o escritor.
Transcrito de G1 - 23/04/2016
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