sexta-feira, 4 de junho de 2021

Luana, musa da CPI, lava nossa alma

RUTH DE AQUINO
JUNE 03, 2021

A médica infectologista Luana Araújo, na CPI da Covid: lealdade aos pacientes, à Ciência e ao Brasil Mais Luanas e menos Nises e Mayras, esse é o Brasil que merecemos. “Não é porque um vírus morre no micro-ondas que eu vou pedir para o paciente entrar no forno duas vezes por dia”. Tem humor ferino a mineira Luana Araújo, médica especialista em doenças infecciosas pela UFRJ. Assim ela detonou, na CPI no Senado, os tratamentos experimentais para Covid, com antivirais in vitro.


 Luana Araújo é médica infectologista, Mestra em Saúde Pública pela Universidade Johns Hopkins (EUA), fala inglês, alemão e português (em desuso no Planalto)

Luana tem mestrado nos EUA em Saúde Pública. Fala bem inglês, alemão e até o português, em desuso no Planalto. Canta, toca piano. No Senado, sapateou em cima dos negacionistas fake com o salto alto do conhecimento e da palavra. A discussão sobre a cloroquina, ela chamou de “delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente”. O tratamento precoce mereceu mais uma ironia: “É como se a gente estivesse escolhendo de que borda da Terra plana a gente vai pular”. Fiquei encantada.

Precoce não é o tratamento com as caixinhas de cloroquina e ivermectina que Mayra, Nise, Pazuello e Bolsonaro coagiram médicos a receitar. Precoce é Luana, que aprendeu a ler e escrever sozinha com dois anos e aos quinze foi estudar música na Áustria, já com ensino médio concluído. Em seu perfil do Instagram, canta em inglês, tocando violão. Aí entendo como Luana soube projetar a voz, esgrimindo as sílabas com clareza em seu depoimento. Suas palavras soaram como música para os meus ouvidos.

Luana é carismática e bonita. Não me venham acusar de machista por constatar e apreciar. Com “a política do apropriado”, ficou feio falar das belas. O irlandês maldito Oscar Wilde dizia que “a beleza é superior à genialidade porque não precisa de comentário; ela é um dos fatos do mundo, não pode ser interrogada, é soberana por direito divino”. E sabemos bem que ele não se referia especificamente às mulheres.

Espero que a infectologista vencedora de bolsa de prestígio para a Universidade Johns Hopkins conviva bem com os elogios e a fama repentina. Importante é seu percurso como médica, suas palestras sobre doenças infecciosas, como voluntária, para crianças e adolescentes. Ela mora em Nova Lima (MG) com o marido, fotógrafo oficial do time do Cruzeiro. Virou a musa da CPI pelo que pensa e fala.

Luana podia ser tudo, menos secretária extraordinária de enfrentamento à Covid no governo Bolsonaro. Ainda levaram 10 dias para perceber que ela era uma médica séria, a favor de máscara, distanciamento social, vacinas. Luana já tinha dito que o Brasil, no combate à pandemia, estava “na vanguarda da estupidez mundial” e que o tratamento precoce das Nises e Mayras não passava de “neocurandeirismo”. No Senado, ao ser confrontada com um vídeo do presidente contra máscaras, reagiu: “Como médica, é muito ruim ver isso. Isso dói”.

Tenha cuidado com os efeitos colaterais dos holofotes, Luana. Já surgiram perfis fake sobre você. Os bolsonaristas não perdoarão a goleada acachapante que você impôs a quem despreza a vida. São um rebanho imune à razão, pronto a se imolar em nome do capitão. Aplaudem mentiras cínicas e debochadas.

“Mais de 320 dias. Esse seria o tempo em que teríamos de ficar quietos para respeitar um minuto de silêncio para cada uma das mais de 460 mil mortes por Covid-19 no Brasil. Só de ontem para hoje, é como se mais de 12 aviões comerciais grandes, lotados tivessem caído em nosso território. Essa é a razão pela qual eu estou aqui hoje. Para mim, isso é intolerável e qualquer pessoa precisa fazer o que estiver a seu alcance para impedir essa hecatombe”.

Você lavou nossa alma, Luana, com sua lealdade aos pacientes e ao Brasil.

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