terça-feira, 27 de novembro de 2018

Impacto do programa “Mais Médicos” é debatido em seminário na Unifesspa

27.11.2018

O Seminário “Obrigado(a) Cubanos(as): o impacto do programa Mais Médicos na saúde dos brasileiros” foi realizado na noite desta segunda-feira (26/11), no Auditório da Unidade III, do campus da Unifesspa em Marabá.

A mesa de honra da solenidade foi composta pelo representante do Conselho Regional de Psicologia - Augusto da Costa Severo, coordenadora do curso de Enfermagem da Faculdade Carajás - Sarah Laís Rocha, coordenadora dos cursos de Enfermagem e Fisioterapia da Faculdade Metropolitana - Carla Nogueira Soares, diretora da Faculdade de Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde e Biológicas (Iesb) Priscila Castro, diretora da Faculdade de Psicologia do Iesb – Lúcia Cavalcante, diretora adjunta do Iesb – Ana Cristina Viana Campos, a vice-reitora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), Idelma Santiago da Silva e o reitor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará,  Maurílio de Abreu Monteiro.

O Seminário objetivou o compartilhamento de experiências e relatos sobre o impacto do 
Programa Mais Médicos no sul e sudeste do Pará. 

O reitor da Unifesspa Prof. Dr. Maurílio Monteiro falou com preocupação sobre a saída dos médicos cubanos do Programa “Mais Médicos” no Brasil. “São muito graves as consequências da saída dos médicos cubanos em relação à assistência à saúde de milhares de habitantes do sul e sudeste paraense, pois todos nós sabemos das dificuldades de termos presentes profissionais de saúde, especialmente médicos, em áreas de difícil acesso ou de alta vulnerabilidade social, como as tribos indígenas, vilas mais distantes, como por exemplo, as Vilas Sudoeste e Lindoeste em São Félix do Xingu, além das áreas periféricas de nossa cidade”, pontuou o reitor.

Ainda segundo ele, “os médicos cubanos estavam em todos os municípios do sul e sudeste paraense. Estavam justamente nestas áreas onde a presença dos profissionais de saúde se faz mais necessária”, disse.

Para Monteiro, os médicos cubanos ampliaram o acesso e a melhoria da qualidade dedicada à atenção primária à saúde, dando uma contribuição muito importante e valiosa para a garantia de acesso universal e equitativo às essas ações de saúde em nossa região. “Somos muito gratos, sobretudo pelo exemplo e dedicação à saúde coletiva e ao cuidado aos que mais necessitam”, concluiu.

Para o representante do Conselho Regional de Psicologia Augusto da Costa Severo, a saída dos médicos cubanos é vista como danosa, sobretudo, dos que atuavam na região amazônica. “Expressamos a nossa gratidão pelo trabalho desenvolvido aqui, mas não podemos deixar de ressaltar a nossa tristeza com a saída deles. É uma grande perda”, argumentou.

Os discentes do curso de Saúde Coletiva Eric Renato Lima Figueiredo e Christian Souza de Araújo apresentaram um panorama do Programa “Mais Médicos” no Brasil, destacando os impactos positivos dele na sociedade e os avanços da saúde nesse período em que os médicos cubanos estiveram no país.

Para o morador do Residencial Jardim do Éden Raydon de Souza Nascimento e João Felipe Miranda, do Residencial Tiradentes, no núcleo Morada Nova, em Marabá, os médicos cubanos vão fazer muita falta porque desempenharam um papel fundamental em prol da saúde de nossa região e que todos já estão sentindo falta do atendimento humanizado que eles prestavam.

Durante a programação foi exibido um documentário curta-metragem de Araquém Alcântara - fotógrafo de natureza no Brasil e um dos mais importantes fotógrafos da atualidade, além de depoimentos de profissionais de saúde e de usuários do programa Mais Médicos.

De acordo com a organização, o objetivo do seminário foi o de prestar uma homenagem aos médicos cubanos que atuaram na região.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Não foi o antipetismo que derrotou Haddad. Foi a fraude em favor de Bolsonaro no WhatsApp. Aqui a prova

31.10.2018

Twitter enviado pelo Diretor do DataFolha: fraude influenciou resultado

Seguindo a lenga-lenga da mídia, a quem interessa derrota do PT, de quase todos os seus analistas, e até do raivoso e frustrado perdedor Ciro Gomes, foi o antipetismo que derrotou Haddad.

É mentira. Basta olhar os números das pesquisas Ibope e Datafolha e compará-los com o que veio a seguir e que depois se descobriu, na nunca por demais incensada reportagem de Patricia Campos Mello, a fraude de fake news no WhatsApp em favor de Bolsonaro, patrocinada por empresários - uma dupla ilegalidade: as calúnias e mentiras, e o financiamento da campanha por empresários como caixa 2.

Até o dia 29 de setembro, mostram as pesquisas, o cenário era de subida de Haddad e estagnação de Bolsonaro. Em 29 de setembro, dia da grande manifestação #EleNão das mulheres, quando centenas de milhares delas foram às ruas, o cenário do segundo turno nos dois institutos era:

Só o crime praticado pelos empresários assegurou o crime eleitoral

Esse é o resultado real do segundo turno das eleições de 2018


Reparem que nas duas pesquisas Haddad vencia Bolsonaro. No Datafolha com seis pontos de vantagem. Onde o antipetismo está aí? Como se explica o antipetismo então?

Não cola. Haddad subia constantemente. Bolsonaro estava parado e só começou a subir após a manifestação, segundo analistas apressados, ou após o WhatsApp ter disparado mais de 80 milhões de mensagens caluniosas contra Haddad, relacionando-o a pedofilia, ao kit gay, às mamadeiras com bico em forma de pênis. Essa a razão verdadeira.

Está aí, na fraude eleitoral, a razão da derrota de Haddad. Se não fosse a fraude, até agora impune, muito provavelmente Haddad teria vencido, como era a tendência em todas as pesquisas.

Não é que não exista antipetismo. Existe, mas a faixa dele é histórica, em torno dos 30%. A fraude em favor de Bolsonaro, usando "decência" como tema de campanha, influenciada por FHC, como mostrei aqui (FHC, via Xico Graziano, deu o tema da campanha de Bolsonaro ), retirou votos de eleitores tradicionais do PT, assustados com as afirmações caluniosas.

Vamos esperar que a Justiça se faça e a candidatura de Bolsonaro seja impugnada por fraude. É o mínimo que se pode esperar.

Até lá, vamos responsabilizar quem de direito: a fraude de empresários em favor de Bolsonaro no WhatsApp. Eles viraram o jogo em favor de Bolsonaro.

Fonte: https://blogdomello.blogspot.com/2018/10/nao-foi-o-antipetismo-que-derrotou-haddad-foi-a-fraude-aqui-a-prova.html?m=1&fbclid=IwAR2zvElcbA1F1N7tiQhng6HVpYSTu0u78RlDDS0s1V0186v25BFNcS9i0Io

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

The Guardian destaca negacionismo climático de futuro chanceler brasileiro

15.11.2018

Novo Ministro Brasileiro das Relações Exteriores crê que “aquecimento global é uma trama marxista” e se torna motivo de piada na imprensa nacional e internacional (Foto: Sul 21)

O jornal britânico The Guardian destacou em matéria publicada em seu site nesta quinta-feira (15) que o futuro ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, acredita que o “aquecimento global é uma trama marxista”. O artigo argumenta que a indicação do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), irá gerar preocupação o movimento climático global, destacando que o Brasil é o país em que a comunidade internacional se reuniu inicialmente, em 1992, para discutir a redução dos gases do efeito estufa.

Já o jornal americano The New York Times destacou que Araújo é um diplomata pró-Donald Trump, presidente dos Estados Unidos. O espanhol El País também destaca que Bolsonaro escolheu um “trumpista” e optou por ignorar as indicações de diplomatas “mais moderados”, alimentando assim o temor de que produza atritos com o governo chinês, principal parceiro econômico do Brasil.

O francês Le Monde caracterizou Araújo como uma “personalidade desconhecida” no País e destacou suas posições políticas, que incluem a defesa da ditadura militar brasileira. Já o argentino Clarín classificou o futuro ministro como um diplomata “ultraconservador e furioso crítica da globalização”.

Fonte: https://www.sul21.com.br/ultimas-noticias/politica/2018/11/the-guardian-destaca-negacionismo-climatico-de-futuro-chanceler-brasileiro/

terça-feira, 13 de novembro de 2018

ONDA DE FAKE NEWS: Jornalista faz dez perguntas sem resposta sobre uso das redes sociais por Bolsonaro

13.11.2018

“Por que a empresa não informou ao TSE o impulsionamento de conteúdo pró-Bolsonaro feito por Luciano Hang, que já foi multado por isso”, pergunta ao Facebook a jornalista
Patricia Campos Mello

PIXABAY - whatsapp-pixabay.jpg
WhatsApp: aplicativo não é pago para impulsionar conteúdos; são empresas e campanhas que fazem essa tarefa

São Paulo – A jornalista Patricia Campos Mello, da Folha de S. Paulo, autora da reportagem que durante a campanha para o segundo turno nas eleições deste ano denunciou o esquema de doação ilegal de empresas à candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) e o impulsionamento de conteúdo (leia-se fake news) pelas redes sociais em desacordo com a legislação eleitoral, divulgou nesta terça-feira (13) em sua conta no Twitter dez perguntas sobre a fraude eleitoral do candidato do PSL que continuam sem resposta.

Para o Facebook, por exemplo, a jornalista pergunta: “Por que a empresa não informou ao TSE o impulsionamento de conteúdo pró-Bolsonaro feito por Luciano Hang, que já foi multado por isso? Quanto foi gasto em impulsionamento no Facebook que levava o usuário a conteúdos referentes a Bolsonaro?".

E para o WhatsApp, que também pertence ao Facebook, Patricia pergunta: “Quantas contas ligadas às agências foram banidas? Quantas mensagens foram enviadas dos números ligados às agências? Quais os números detectados pelo envio anormal de mensagens? Qual aumento de mensagens nos últimos 12 meses e queda nos últimos 30 dias?” 

Notícia veiculada hoje também no UOL mostra que o deputado federal Laudívio Carvalho (PODE-MG) admitiu que utilizou dados de 40 mil pessoas cedidos por uma agência de marketing digital para fazer disparos de mensagens via WhatsApp durante as eleições deste ano – mais um caso em que a prática ilegal vem à tona.

Confira as perguntas da jornalista:

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Retrocedemos nos Direitos Humanos

12.11.2018

O Brasil já foi referência na promoção dos direitos humanos, mas hoje vive uma redução dessas garantias. Essa foi a conclusão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA (Organização dos Estados Americanos) após uma semana de visitas a diversos estados do país.


“O Brasil se consolidou como um país de referência sobre políticas de direitos humanos, políticas de infância, que se constituíram através de governos distintos, como um compromisso de estado”, disse Antonia Errejola, relatora para o Brasil. “Mas a comissão tristemente identificou uma redução da intensidade dessa dinâmica.

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Em entrevista coletiva no Rio de Janeiro nesta segunda (12), a comissão divulgou um relatório preliminar com recomendações sobre o que viu. Destacou violações a indígenas, quilombolas, moradores de rua, trabalhadores rurais, presos e moradores de favelas e periferias, além de imigrantes, transexuais, defensores dos direitos humanos e à imprensa.

A CIDH passou a última semana, a convite do governo brasileiro, se reunindo com a União, diversos órgãos públicos, representantes da sociedade civil, defensores dos direitos humanos, comunidades e vítimas de violência.

Foram visitados estados como Brasília, Minas Gerais, Pará, São Paulo, Maranhão, Roraima, Bahia, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. É a segunda vez que a comissão vem ao Brasil, apesar de fazer um monitoramento constante à distância —a primeira foi em 1995.

A violência por agentes de segurança e o “padrão de impunidade sistemática em tais casos” foi um dos pontos mais criticados, mas também as mortes de policiais. “Os direitos humanos valem para todos, é importante frisar isso”, afirmou Errejola, que citou a falta de conclusão do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista.

No campo da liberdade de expressão, a delegação frisou os ataques recentes à imprensa no período eleitoral, condenou o “ambiente de discursos de intolerância e ódio contra minorias que se criou” e criticou a criminalização de movimentos sociais através de lei antiterrorismo.

Também chamou a atenção para a ausência de políticas públicas para a reforma agrária e o acesso à terra, bem como para a discriminação de venezuelanos em Roraima —mas pontuou como avanço a sanção de uma nova lei de migração neste ano.

Em São Paulo, classificou a região da cracolândia, onde se concentram usuários de drogas, como “desumana” e “sem perspectivas de um projeto de vida digna”. Também defendeu a regularização da ocupação Vila Nova Palestina, no Jardim Ângela (zona sul).

Por outro lado, o relatório da CIDH celebra medidas recentes no país. Entre elas estão a aprovação recente da lei que institui o Susp (Sistema Único de Segurança Pública) e de uma política nacional para a área e a implementação de audiências de custódia.

Elogia ainda decisões do Supremo Tribunal Federal, como a que transferiu presas grávidas ou mães de crianças para a prisão domiciliare a que garantiu a livre manifestação de ideias em universidades após apreensões da Justiça Eleitoral em unidades públicas de ensino.

Nós próximos meses a OEA vai preparar e publicar um relatório final sobre a situação do país.

Fonte: https://blogdacidadania.com.br/2018/11/retrocedemos-nos-direitos-humanos/

domingo, 11 de novembro de 2018

Por que Getúlio Vargas criou o Ministério do Trabalho, que Bolsonaro quer extinguir

10.11.2018

Rafael Barifouse

Vargas criou o ministério para intermediar relações entre trabalhadores e empresários, função até então do Ministério da Agricultura

Caso seja confirmada a extinção do Ministério do Trabalho no governo de Jair Bolsonaro, conforme anunciou o presidente eleito nesta semana, será a primeira vez em 88 anos que o país não terá uma pasta na área, desde que Getúlio Vargas (1882-1954) a criou após chegar ao poder.

Hoje, esse ministério é responsável por elaborar diretrizes para geração de emprego e renda, além de emitir documentos e fiscalizar as relações trabalhistas no Brasil, investigando denúncias de trabalho escravo e infantil e o cumprimento da legislação por parte das empresas. Mas sua criação teve outro propósito.

Quando surgiu, em 26 de novembro de 1930, a ideia era que a pasta fosse responsável por intermediar as relações entre trabalhadores e empresários, até então sob a responsabilidade do Ministério da Agricultura.

"Era uma política alinhada com o que se pensava então sobre o papel do Estado como um mediador das relações entre grupos e indivíduos", explica Renan Pieri, professor de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e do Insper.

"Vargas dá um golpe de mestre e assume a dianteira deste processo, estatizando estas relações."

A criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio foi uma das primeiras iniciativas de Vargas ao assumir o governo por meio de um golpe, após a Revolução de 1930, que culminou com a deposição do então presidente Washington Luís (1869-1957) e o impedimento de que seu sucessor, Júlio Prestes (1882-1946), assumisse o cargo, dando fim à República Velha.

A pasta foi batizada de "ministério da Revolução" por Lindolfo Collor (1890-1942), seu primeiro titular e avô do ex-presidente Fernando Collor de Melo.

"Essa revolução se refere a uma ruptura com a velha oligarquia agrária por meio da criação de um Estado positivista, a instauração de um modelo legal e burocrático que passa a organizar as relações sociais por meio do monopólio da força através de um sistema normativo", diz Marcelo Nerling, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP).

"O Estado passa a ser o protagonista, baseado na crença de que é possível mudar a realidade social por meio de normas criadas de cima para baixo."

Nerling explica que não havia na época no Brasil um Estado como conhecemos hoje. "A administração pública só começa a se organizar a partir da década de 1930. Até então, as principais forças do país estavam concentradas nos municípios, comandados por coronéis. Era um modelo descentralizado e patrimonialista, em que não se separava o público do privado."

Qual foi o impacto da criação do Ministério do Trabalho?
Uma das primeiras medidas do novo ministério neste sentido foi criar uma nova regulamentação da atividade sindical, com critérios para a criação de sindicatos.

Entre as novas regras, estava haver uma única representação para profissionais de uma categoria dentro de uma mesma região, um mínimo de 30 membros, com ao menos dois terços de brasileiros, veto a qualquer manifestação política e ideológica, punições a empresários que impedissem a sindicalização dos trabalhadores e a aprovação da entidade pelo ministério - até então, não se dependia de autorização do governo.

O ministro Collor declarava na época que enxergava os sindicatos como uma forma de mediar os conflitos e tinha como objetivo trazer estas organizações para a órbita do novo ministério para que passassem a ser controladas pelo Estado.

"Vargas queria que os sindicatos se tornassem satélites do governo, politizando as relações entre empresas e trabalhadores", diz Pieri.

Na época, o Brasil ainda era um país extremamente rural, mas havia uma indústria nascente, que ganha força em reação ao crescente impedimento de importar produtos da Europa a partir da Primeira Guerra Mundial.

Ao mesmo tempo, a abolição da escravatura lançou um grande contigente de mão de obra ao mercado enquanto houve simultaneamente uma chegada massiva de imigrantes a partir do fim do século 19, facilitada pela Constituição de 1891, que, ao mesmo tempo, consagrou o direito de livre associação.

Surge, assim, uma classe de trabalhadores urbanos e de profissionais liberais, e se formam os primeiros movimentos sindicais, que foram reconhecidos e regulamentados em lei ao longo da primeira década do século 20, primeiro para os trabalhadores agrícolas e, depois, para os urbanos.

"Com a formação de uma economia de mercado, foi natural a formação de sindicatos especializados para representar os trabalhadores", diz Pieri.

Ao mesmo tempo, nas questões relativas a direitos, o regime de Vargas buscava atender reivindicações históricas dos trabalhadores, alinhado com a ideia da outorga dos direitos trabalhistas pelo Estado.

"Vargas havia acompanhado o que ocorreu na Rússia a partir de 1917 com a revolução, quando, em meio ao conflito entre capital e trabalho, o proletariado assumiu o poder. Então, ele, que era um capitalista, sabia aonde isso poderia acabar", diz Nerling.

"Vargas sabia que, se os trabalhadores fizessem greve atrás de greve para reivindicar direitos, poderiam quebrar o capital. Ele opta por chamar para si a responsabilidade de regular estas relações, cria leis que vinculam os cidadãos. Entrega os anéis para não perder os dedos."

O que mudou a cada Constituição?
O ministério teve sob Vargas uma atividade legislativa intensa. Foram lançadas medidas importantes, como a criação da carteira profissional (precursora da atual carteira de trabalho e previdência social), a regulamentação do trabalho feminino e infantil e o estabelecimento de juntas de conciliação de conflitos entre patrões e empregados, que seria um embrião da Justiça do Trabalho, criada pela Constituição de 1934 e que passaria a atuar a partir de 1941.

CAMILA DOMINGUES/ PALÁCIO PIRATINI
Ministério criou a carteira profissional, precursora da atual carteira de trabalho e previdência social

Também se destaca a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões, que mudaram o sistema previdenciário do país. Ainda seriam instituídos o salário mínimo, a jornada de trabalho de oito horas e o descanso semanal, as férias remuneradas e a indenização por dispensa sem justa causa.

Uma das iniciativas de maior peso foi a instituição em 1943 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que unificou as leis trabalhistas existentes até então. O dia em que recebeu a sanção presidencial, 1º de maio, passaria a ser o Dia do Trabalho, feriado celebrado até hoje em todo o país.

As décadas após a primeira era Vargas foram marcadas por diversas mudanças nas leis e direitos trabalhistas.

Em 1946, a Assembleia Constituinte convocada após o fim da ditadura, acrescentou novos pontos como o direito à greve e o descanso remunerado aos domingos e feriados.

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) surge em 1966, já durante o regime militar, para proteger o trabalhador demitido sem justa causa com uma conta aberta em seu nome, vinculada a seu contrato de trabalho, na qual são depositados mensalmente o correspondente a 8% do salário.

A Constituição de 1967 instituiu a aplicação da legislação trabalhista a empregados temporários, a proibição de greve em serviços públicos e atividades essenciais e o direito à participação do trabalhador no lucro das empresas, entre outras medidas.

A partir da Constituição de 1988, passam a ser previstos medidas de proteção contra demissões sem justa causa, o piso salarial, a licença maternidade e paternidade, o veto à redução do salário, a limitação da jornada de trabalho a oito horas diárias e 44 horas semanais e proibição de qualquer tipo de discriminação quanto a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência. Também foi criado o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), destinado em parte ao custeio do Programa de Seguro Desemprego.

"São políticas criadas e geridas dentro do Ministério do Trabalho, por ele oferecer um corpo técnico e orçamento dentro do governo para discutir essas relações, mas que têm muito mais a ver com o ambiente político de cada época, a pressão popular por mudanças e cada governo do que com o órgão em si", avalia Pieri.

O economista destaca que a partir dos anos 1990, a pasta assume um papel cada vez mais de fiscalização do cumprimento das normas e leis trabalhistas e na gestão de recursos como os do FGTS e do FAT.

E se o ministério acabar?
Se sua extinção se confirmar, não será a primeira vez que o Ministério do Trabalho será fundido com outras áreas.

Ao surgir em 1930, a pasta também era responsável por indústria e comércio. Em 1960, passa ser Ministério do Trabalho e Previdência Social. Torna-se puramente Ministério do Trabalho em 1974. Em 1990, volta a incorporar a Previdência.

REUTERS
Presidente eleito anunciou a extinção do Ministério do Trabalho

Dois anos depois, passa a ser o Ministério do Trabalho e da Administração Federal e, em 1999, do Trabalho e Emprego. Em 2015, vira mais uma vez Ministério do Trabalho e Previdência Social, até, em 2016, tornar-se novamente apenas Ministério do Trabalho.

Ao tratar do tema, Bolsonaro já declarou em entrevistas que o trabalhador terá de"decidir entre menos direito e emprego ou todos os direitos e desemprego". "Os encargos trabalhistas fazem com que se tenha aproximadamente 50 milhões de trabalhadores brasileiros na informalidade", disse à rádio Jovem Pan.

Pieri avalia que, com o anúncio do fim da pasta, surge uma "incerteza jurídica" sobre quem exercerá os papéis que hoje cabem ao ministério. "Isso é uma questão mais importante do que se terá ou não um status de ministério, que é algo secundário."

Nerling discorda e acredita que a transformação da pasta em uma secretaria sinaliza quais serão as prioridades do novo governo.

"Isso representa uma mudança de paradigma. Quando você dá a uma área status de ministério, diz que as políticas públicas nesta área serão priorizadas. Em um governo, a tomada de decisões ocorre em camadas, e a alteração de status precariza o cumprimento das competências que hoje cabem ao ministério, retira força e abala a eficácia de suas políticas", diz Nerling.

"Ao dizer que se deve escolher entre trabalho e direitos, o presidente eleito diz que os direitos são um problema, mas isso só é um problema para o capital. Se antes o Estado se posicionava para garantir os direitos dos trabalhadores, agora, ele pesa a mão para o outro lado e passa a priorizar o capital."

Por sua vez, Pieri destaca que, com a Reforma Trabalhista, passou a prevalecer sobre as leis trabalhistas a negociação entre sindicatos e empresas.

"O fim do ministério pode sinalizar um novo tempo em que o Estado não mais intermedia a relação entre capital e trabalho. Isso teria no futuro o efeito de despolitizar os sindicatos", diz Pieri.

"Será necessário entender o que o presidente quis dizer com o fim do ministério. Significa um relaxamento da fiscalização e que o governo não está mais pensando nestes problemas ou apenas uma mudança burocrática? Bolsonaro não pode dar uma canetada e tirar direitos, mas temos de debater se alguns benefícios previstos na lei de fato beneficiam o trabalhador."


Sobre a temática, veja os filmes a seguir:

Os prós e contras do Mercosul
https://youtu.be/1gFM-7FNNBI

O Brasil que Bolsonaro vai herdar
https://youtu.be/660qsQ7rfWE

O que explica a crise na 'rica' Venezuela
https://youtu.be/jbX0fpNVIdI

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-46159747?SThisFB&fbclid=IwAR32ke6wL-Azym49nGN0nvMBg8KJ-pH0QiG06SR1TbwkJyur2OUtJeHacN0

O governo é civil

11.11.2018

Janio de Freitas

Será crucial desvendar quanto os militares estarão dispostos a proteger Bolsonaro

O futuro das incertezas e dos temores com o governo Bolsonaro depende, a rigor, de um fator dominante sobre todos os demais. E ausente das cogitações atuais por ainda faltarem motivos que o tornem perceptível.

Em todas as possíveis circunstâncias que não sejam de aceitação majoritária com o andar de tal governo, os outros Poderes e a legislação dispõem de variadas medidas corretivas. Aplicá-las, porém, não decorre só de existirem.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), calado durante transmissão nas redes sociais

As injunções políticas e os interesses representados no Legislativo e no Judiciário combinam-se como força decisória. Não, porém, no caso de Bolsonaro.

Se as coisas desandarem, o importante para antever o seu rumo será desvendar quanto os militares estarão dispostos a empenhar em barragem de proteção a Bolsonaro. O que dependerá da identificação, ou confusão, entre o Exército e o governo conduzido por ex-ocupantes das suas casernas.

O trabalho para criar essa identificação vem desde a campanha, à qual deu contribuição por certo significativa. Mas sua intensificação pós-resultado eleitoral ganha proporções mais do que inadequadas. 
Fazer tocar o hino do Exército, por exemplo, no saguão do hotel onde ocorrem as reuniões do círculo de Bolsonaro é abusivo.

Até que se constate o contrário, se isso acontecer, o governo será poder civil. Mesmo os generais reformados que vão para ministérios administrativos estarão em cargos civis, sem diferença do advogado e do político em outro ministério. 

E, com a forçada identificação, o que o Exército ganha não lhe convém, nem ao país: é o risco de ser identificado com possíveis insucessos de Bolsonaro e seu governo.

Além do mais, há uma contradição que inclui todos os modos de explorar a imagem do Exército utilizados agora e desde os primeiros passos de Bolsonaro na vida política. Se preza tanto o Exército, por que não agiu de modo a ser bem aceito nele? Citada várias vezes em dias recentes, a frase de Geisel é terminante: "Bolsonaro é um mau militar". Indesejado por desordem e insubordinação, foi induzido e conduzido à reforma.

A identificação é buscada, em parte está atingida, mas não é autêntica nem legítima.

O SITIADO
Os depoimentos de Emílio e Marcelo Odebrecht, pai e filho, no meio da semana, tiveram cara e coroa. Ambos disseram que antes das melhorias no sítio de Atibaia não houve doação alguma a Lula como pessoa. Desse modo, confirmavam aquela. Mas disseram também que foi "uma coisa pessoal", nada tendo, portanto, com retribuição a contratos na Petrobras. 
Desse modo, derrubam a tese de Sérgio Moro.

O CRITÉRIO
O senador Blairo Maggi deu o sinal da péssima reação no agronegócio, extensiva a desdobramentos, à hostilidade de Bolsonaro a países árabes, com a mudança da embaixada brasileira em Israel para imitar Trump. Como meio de aplacar a reação, foi decidida a escolha às pressas, para o Ministério da Agricultura, de alguém ligado aos ruralistas.

Veio a ser a deputada Tereza Cristina. Com péssima repercussão dos críticos ao desmatamento, defensores dos povos e reservas indígenas, e dos preocupados com o uso disseminado de agrotóxinos na agricultura.

*Jornalista e membro do Conselho Editorial da Folha

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2018/11/o-governo-e-civil.shtml

Dias exemplares

Janio de Freitas

08.11.2018

As relações exteriores deram o sinal das consequências de atitudes levianas.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) fala com a imprensa após almoço com o presidente do STJ, João Otávio de Noronha - Pedro Ladeira - 7.nov.2018/Folhapress

Além da dose excessiva de incerteza sobre sua eficácia, as novidades decididas por Bolsonaro sem base em estudos trazem outro risco, por ora silenciado. Se a estrutura de poder é destroçada em vez de corrigida, como os novos ungidos começam a fazer, o dano exigirá custo e tempo imensos para a recuperação da máquina de governo e das relações internacionais do Brasil as políticas como as comerciais e as culturais.

A dissolução do Ministério do Trabalho é um bom exemplo. As junções feitas a tapa não deram para reduzir a 15 os ministérios, quantidade escolhida por Bolsonaro como um número na loteca. Corta mais, corta esse, esse não, corta o Trabalho. Pronto. Mas o total ainda está em 18. No país do desemprego, do destaque mundial em acidentes do trabalho, da formação apenas intuitiva da mão de obra, do sindicalismo deformado, o Ministério do Trabalho posto à altura do seu nome teria funções primordiais.

O meio ambiente já foi anexado pelo agronegócio e libertado ao menos três vezes. Agora está na coluna do meio. O Ministério da Educação, que não dava conta de si mesmo, por ora está condenado a engolir o do Esporte e o da Cultura, que, já se sabe, não serão digeridos. O da Fazenda está açambarcando tudo o que passa por perto, com o projeto de tornar-se uma grande casa de cômodos a abrigar tudo o que tenha influência capital na vida do país. E vai por aí, com indústria, transportes, integração, saúde-saneamento, e todo o restante, uns no limbo ou na cova, outros desarticulados.

As relações exteriores deram o sinal do que são as consequências de atitudes levianas. Bastou o safanão de um único país árabe, o Egito, para Bolsonaro tornar indefinida a anunciada mudança da embaixada brasileira em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém. Mera imitação de Trump, desnecessária para Israel e intolerável para os países árabes, faz uma demonstração ao mundo da irresponsabilidade que também o exterior deve esperar do novo Brasil. E aqui dentro os produtores e exportadores de soja e carne, fazedores de fortunas diárias na China e entre os árabes, despertaram em pânico para a realidade governamental que ajudaram a criar.

É apenas o começo do começo. Motivo de reações que o empresariado influente esconde, é pena. O país gostaria de ver como são a perplexidade e as inquietações que as figuras representativas do poder econômico não tiveram com Lula, em fase equivalente à atual. Nem nos dois mandatos seguintes, no entanto por eles repudiados de então à eleição de Bolsonaro.

*Jornalista e membro do Conselho Editorial da Folha

Fonte:https://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2018/11/dias-exemplares.shtml

sábado, 10 de novembro de 2018

Presidenta do Inep dispara: “Não é o Governo que manda no Enem”

10.11.2018

“Nhaí, amapô! Não faça a loka e pague meu acué, deixe de equê se não eu puxo teu picumã!”. A frase em Pajubá - dialeto falado pela comunidade LGBT - fazia parte no último domingo de uma das questões da prova de linguagens do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), cujo objetivo era o de testar os conhecimentos dos estudantes sobre o conceito de dialeto.

Maria Inês Fini, presidenta do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep)

Apesar de a linguagem LGBT ser apenas um exemplo para abordar uma questão técnica, ela gerou a insatisfação de muitas pessoas, que acusaram a prova de “doutrinação esquerdista” e de ser mais um exemplo de que as escolas brasileiras estão impregnadas da “ideologia de gênero” - uma expressão criada por grupos católicos que se popularizou como um movimento entre os que discordam da abordagem sobre diversidade sexual e debate sobre papéis e estereótipos de gênero.

Os defensores da expressão fazem uma leitura conservadora de uma visão educacional que pressupõe que cada indivíduo tem o direito de escolher o próprio gênero, sem que ele seja definido, necessariamente, pelo sexo biológico.

Entre os críticos do Enem e desta questão em específico está o presidente eleito Jair Bolsonaro. Na segunda-feira, em uma entrevista para o apresentador da TV Bandeirantes, José Luiz Datena, o militar reformado compartilhou sua percepção sobre a última edição do maior vestibular do país.

“Ninguém quer acabar com o Enem, mas tem que cobrar ali o que realmente tem a ver com a história e cultura do Brasil, não com uma questão específica LGBT. Parece que há uma supervalorização de quem nasceu assim”, disse. Em seu Twitter, um dia depois, ele declarou ainda que o modelo atual do Enem “não funciona” e afirmou que “não devemos fabricar militantes”.

Nesta sexta, voltou à carga no Facebook: “Pelo amor de Deus, esse tema, a linguagem particular daquelas pessoas, o que a gente tem a ver com isso? Quando a gente vai ver a tradução, um absurdo”, disse ele. “Pode ter certeza que não vai ter uma questão daquela no ano que vem. Nós vamos tomar conhecimento da prova antes.”

Mas qual, de fato, é  a interferência do Governo na prova que permite a entrada de estudantes em mais de 500 universidades públicas e privadas brasileiras?

Nenhuma, segundo Maria Inês Fini, presidenta do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a autarquia responsável pela realização do Enem. “Não é o Governo que manda na prova”, explicou Fini ao EL PAÍS na segunda-feira.

A elaboração das questões é de responsabilidade exclusiva da área técnica. “O Inep tem uma diretoria específica de técnicos consagrados que com a ajuda de uma série de educadores e professores universitários de todas as regiões do país elaboram a prova”, disse ela.

Maria Inês Fini, que foi cotada para ser ministra da educação no Governo de Bolsonaro, explica que o Inep, por ser uma autarquia governamental, é “alinhadíssimo com o Ministério da Educação”, mas a prova é de responsabilidade total do instituto, o que reserva a ele autonomia para elaborar as questões sem intervenção direta do Governo.

“Em momento algum houve qualquer perspectiva de doutrinação, de valorização de uma posição em detrimento da outra”, diz ela. “Eu só lamento que algumas leituras tenham sido equivocadas, mas cada pessoa, cada leitor do mundo faz uma interpretação do texto da maneira como quer, não é? Com a sua cultura, com seus valores e com as suas ideologias”, completa.

Ela afirma que a prova é uma oportunidade para os jovens brasileiros para que eles possam interagir com a tipologia de muitos autores diferentes. Na prova do domingo, havia do hino nacional a textos a respeito de celíacos.

Para Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP e pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional, questões como a do Pajubá, por exemplo, têm uma importância porque refletem uma realidade que já existe na sociedade.

Mas isso gera incômodo em quem tem dificuldade em reconhecer a inclusão. “Na verdade, essa expressão ideologia de gênero, que eles inventaram, trata-se de reconhecer a existência de determinadas camadas e ninguém vai mudar a sua orientação sexual ou identidade de gênero porque conheceu”, disse o professor.

Polêmicas constantes

Esta não é a primeira vez que a prova desperta polêmicas. Nos últimos anos, com o aumento do acirramento político no país e a organização de movimentos conservadores, a educação tem sido alvo de uma guerra ideológica.

Em 2017, por exemplo, a Justiça Federal suspendeu provisoriamente um item do edital do Enem que zerava automaticamente redações que, entre outras coisas, violassem os direitos humanos. Isso aconteceu após uma ação civil movida pela Associação Escola Sem Partido- uma iniciativa de pais e estudantes para combater a “contaminação político-ideológica” que eles acreditam haver nas escolas brasileiras.

Talita Amaro, cofundadora do maior cursinho popular sem mensalidades do Brasil, o Curso Mafalda, teme que o exame corra riscos de sofrer uma mudança radical na gestão de Bolsonaro. “Em se tratando de um Governo com as tendências já observadas durante a campanha, a depender da direção do Inep e do Ministério da Educação, acho que corremos o risco de termos uma prova enviesada”, disse a estudante de direito da USP que se inscreveu no curso com sua nota do Enem 2017 e já está em sua quarta graduação.

Amaro, que realiza o Enem desde 2008, afirma que a prova “é bastante plural ideologicamente e reflete a produção científica em si”. Ela observa também que, com o aumento da adesão de universidades federais ao exame, o conteúdo cobrado dos participantes tem sido mais conteudista e menos interpretativo.

Para o professor Alavarse, o Enem poderia sofrer alterações de forma indireta no novo Governo, a depender do que for determinado na Base Nacional Comum do Ensino Médio, um documento que estabelece o currículo mínimo para a última etapa do ensino básico.

Para ele, a proposta, que segue em discussão, introduzirá mudanças no conteúdo do que é ensinado, o que pode acarretar em modificações também no exame. “Nós não sabemos qual será a matriz de referência da prova porque não sabemos o que será a Base Nacional do Ensino Médio”, diz. “O futuro do Enem está numa encruzilhada.”

Fonte: https://blogdacidadania.com.br/2018/11/presidenta-do-inep-dispara-nao-e-o-governo-que-manda-no-enem/

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

A crise permanente: poucos perceberam que a aparente inabilidade de Bolsonaro era operação ensaiada

09.11.2018​

Vladimir Safatle*

O senso comum acredita haver uma dicotomia importante entre crise e governo. Ou seja, tudo se passa como se a função do bom governo fosse impedir as sociedades de entrarem em crise ou de combater as crises que nelas se instalam. 

No entanto, o Brasil irá rapidamente descobrir uma nova forma de governo. Uma forma para a qual governar é alimentar continuamente crises capazes de capturar as forças de contestação social.

Durante certo tempo, muitos acreditaram que o senhor Bolsonaro era alguém desastrado com as palavras e com as ações. Poucos perceberam que a aparente inabilidade era operação bem ensaiada. Ela é apenas um exemplo do que significa governar hoje em dia. 

O jogo consiste em fazer os ocupantes do poder definirem todas as pautas de discussão da sociedade civil. A sociedade deve se mobilizar, discutir e se rebelar a partir de uma agenda cujo enunciador é o próprio governo. Isso faz de todo movimento social um movimento reativo impulsionado pela velocidade descontrolada com que o governo parece produzir catástrofes potenciais.


Ilustração de Marcelo Cipis para coluna de Vladimir Safatle de 9 de novembro de 2018. - Marcelo Cipis

A dinâmica já havia sido colocada em prática na campanha eleitoral. Toda ela foi pautada por uma só dinâmica. O senhor Bolsonaro e os seus falavam algo abominável a respeito dos setores mais vulneráveis da população (mulheres, LGBTs, negros, índios). Depois, aqueles que se solidarizavam com tais setores se mobilizavam e colocavam em marcha uma impressionante energia de revolta. Nos dias posteriores, os próprios enunciadores se desdiziam, afirmavam que tiveram o significado de suas falas distorcidas. Mas, logo em seguida, aparecia outra abominação, e assim foi até o último dia de campanha. 

Dessa forma, a sociedade ficava aprisionada à pauta e à dinâmica produzida pelo próprio Bolsonaro. O objetivo final era dar a impressão de que esses setores da sociedade tinham apenas uma ação reativa, sem nenhuma capacidade de proposição.

A mesma lógica foi implementada agora, nas primeiras semanas de ensaio do que será um governo por vir. Primeiro, ressuscita-se o ignóbil programa Escola Sem Partido, fazendo toda a sociedade se mobilizar contra ele. Depois, adia-se sua votação na Câmara, como se fosse para dar um alívio momentâneo. Posteriormente, o programa volta e, junto com ele, toda a coreografia. 

Outro exemplo foi a discussão imoral a respeito da transferência da Embaixada Brasileira em Israel para Jerusalém. Fora os EUA, nenhum outro país relevante no mundo o fez por saber o que significa naturalizar um processo de ocupação que impede a viabilização de um Estado (a Palestina) reconhecido pelo próprio Brasil. Logo em seguida, o senhor Bolsonaro deu indicações de voltar atrás.

Enquanto isso, a oposição a seu governo fica presa em um movimento no qual ela não consegue fazer os dois processos que precisariam ser feitos agora, a saber: uma autocrítica implacável do passado e uma mobilização a partir de nova capacidade de propor e afirmar. Em política, não basta apenas dizer o que não se quer. Há de se saber mobilizar a partir da capacidade de fazer as pessoas sonharem e quererem novas alternativas. 

O que se coloca a nós atualmente é simplesmente um governo cuja grande novidade consiste em fazer a roda da história voltar 40 anos para trás. Contra isso, é necessário mostrar novas formas de experiência de poder e de produção de riquezas. Levar as pessoas a não apenas agir por medo, mas por confiança na sua própria capacidade de tomar o poder nas mãos, em vez de entregá-lo para uma representação caricata de força e mando. 

Levá-las a não se curvarem a um processo brutalizado de espoliação, mas a assumirem o desejo de uma economia que não seja mais o antagonismo fundamental da solidariedade. Mas, para tanto, faz-se necessário saber parar de se submeter à crise permanente que o próximo governo irá gerenciar.

*Professor de filosofia da USP, autor de “O Circuito dos Afetos: Corpos Políticos, Desamparo e o Fim do Indivíduo”.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2018/11/a-crise-permanente.shtml