sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Smartphone modifica o mapa cerebral

JOEL RENNÓ

Há duas décadas atrás poucos entre nós tinham celulares touchscreens sendo que na atualidade é raro alguém não tê-los. Sua facilidade de uso fornece uma interface perfeita com celulares, tablets e computadores e passamos literalmente horas todos os dias interagindo com esses dispositivos por meio de telas sensíveis ao toque.
Cientistas da Universidade de Fribourg e do Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique, na Suíça, foram pesquisar se tal uso frequente de equipamentos touchscreen poderia alterar o funcionamento cerebral. Usando EEG (eletroencefalograma) e potenciais evocados somatossensoriais (uma medida de EEG de resposta do cérebro à estimulação tátil), eles descobriram que os usuários de smartphones aumentaram as respostas cerebrais à estimulação do seu polegar. Este aumento foi diretamente proporcional à intensidade média de uso de smartphones e suas flutuações do dia-a-dia. Os investigadores concluíram que o processamento sensorial no cérebro é continuamente atualizado pelo nosso uso de tecnologia moderna. Esse trabalho acabou de ser publicado na prestigiada revista científica Current Biology.
Pesquisas anteriores já haviam mostrado que os músicos tinham aumentado as respostas cerebrais ao toque de dedo, como fazem os cegos que lêem Braille.  Os pesquisadores recrutaram 38 estudantes universitários dos quais 27 tinham um smartphone, os restantes 11 estudantes ainda usavam da velha tecnologia dos botões numéricos. Eles primeiro confirmaram que os proprietários de smartphones touchscreen usaram seus aparelhos por muito mais tempo a cada dia e com uso predominante do polegar direito. Em seguida, durante a gravação do EEG, os investigadores deixaram que a estimulação tátil fosse realizada para a ponta de cada um dos três primeiros dedos. Eles encontraram um aumento considerável na magnitude das respostas do cérebro, o mais importante para o polegar, mas também para os dedos indicador e médio. Com base na localização e de tempo das respostas, foi verificado que as mudanças envolveram a representação dos dedos no córtex cerebral somatossensorial primário. E tais respostas eram mais intensas quanto mais frequente era o uso dos aparelhos dez dias antes da gravação do exame de EEG. Quem tinha usado o celular bem próximo ao dia do exame tinha também uma potencialização das respostas.
No geral, os resultados deste estudo sugerem que tais modificações cerebrais são necessárias para controlar eficientemente smartphones com controle motor fino.
Nenhum estudo científico é perfeito e a grande fraqueza do presente trabalho é o fato de que todas as análises foram baseadas nas próprias medições de EEG. Além disso, alguns dos testes estatísticos foram realizados diretamente sobre as formas de onda de EEG individuais, que não são inteiramente adequados índices da atividade neural subjacente. No entanto, este estudo é uma bela confirmação experimental da noção de que o cérebro, de forma dinâmica e continua, se adapta às mudanças no ambiente e na experiência sensório motora de uma maneira plástica espetacular. É mais uma das provas de que a tecnologia pode sim levar a mudanças concretas no funcionamento cerebral dependendo da frequência e intensidade do uso.

Transcrito de http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/mentes-femininas/2015/02/06/smartphone-modifica-o-mapa-cerebral/

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