Entrevista com Eliana Yunes
Jornal de Ponta Grossa: A primeira pergunta é baseada no tema de sua palestra: Ler faz a diferença? Como e por quê?
Eliana Yunes: Ler faz toda diferença, sobretudo se pensarmos que não se lê apenas o escrito, o livro, mas lemos o mundo pela oralidade (as histórias que ouvimos todos os dias a respeito do que acontece à volta, além das histórias clássicas que a memória guardou), pelos movimentos (a dança, a encenação), pelos sons (a música instrumental ou como palavra cantada), pelas formas dos objetos, etc. Lemos o mundo e precisamos ler a 'letra' em que ele se grafa, recordando-nos experiências que a humanidade acumulou. Quem não lê o mundo cifrado nas múltiplas linguagens, está excluído ou alienado da vida. São muitos códigos, e não temos o direito, nem nos podem negar o direito de entendê-los para poder escolher, com alguma autonomia, nosso lugar na vida social: ler é um ato político!
Como a escola pode formar uma geração de leitores críticos?
Não forma leitores quem não é leitor. Certa vez um ministro da educação me disse que não via a necessidade de um programa de formação de leitores na escola, porque todo professor era obviamente leitor, e portanto, apto a ensinar a leitura. Ele não percebeu o que não estava lendo: a falta de familiaridade com o conhecimento, apresentado em fórmulas e esquemas frios e mortos, passa pela falta de experiência, vivência com a palavra, com a leitura, sobretudo com a literatura, independente da área de conhecimento. Formar leitores significa dar acesso às narrativas que contam a vida, através da ficção e da ciência, como passaporte para se tornar cidadão, “senhor da cidade”, responsável na sua medida pelo que constrói como História - como histórias... - tomar gosto por dizer e dizer-se. Leitor crítico é aquele que é capaz de pensar diferentes possibilidades de sentido, ter diferentes entendimentos do texto/da textualidade e poder optar por um, de forma coerente com toda a bagagem que traz. O leitor crítico é o que tem discernimento sobre o que lê, e isto é um aprendizado de interações e diálogos. A escola pode fazer isto ter mais efeito que outros meios, embora não seja a única mediadora.
Para isso, qual é a importância do envolvimento da escola e da família? Ambos estão preparados?
Acima respondi sobre a escola. Quanto à família, depende de que família, de que contexto. Muitas vezes os pais são iletrados mas podem ler o mundo por outras linguagens. De nada vale, se não dialogar, não mostrar como entende e porque entende de tal forma um fato, um caso, um acontecimento. Estar preparado é nosso calcanhar de Aquiles: é preciso saber o que se faz e como se constrói o sentido das coisas. Precisamos de políticas de Estado para nos amparar em todos os espaços sociais, a nos tornarmos aptos a agir como leitores e 'eleitores' da vida social que queremos entregar às novas gerações.
Como congressos, como o que será realizado em Ponta Grossa, pode contribuir para o debate sobre o tema leitura e literatura, e para o fomento de leitores críticos? Qual é a sua importância para a sensibilização, não apenas dos educadores, mas da comunidade?
Toda! Quanto mais se der visibilidade, espaço público para este debate e para a circulação da informação e acesso aos bens culturais como um todo, mais estaremos agilizando o processo de participação de toda a sociedade na formação de leitores, de forma a universalizar este direito: quem lê e escreve, desta ou daquela forma, do romance ao blog, e participa da vida política, ajudando a comunidade, a cidade, o país a se pensar. Muitas instituições se apresentam como promotoras da leitura, mas seus dirigentes sequer sabem o que promovem, ou sabendo, não querem efetivamente ter outros como interlocutores. E se julgam os únicos sujeitos da história, curta, é verdade, em que estão protagonizando.
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