Wandecy de Carvalho
Com
este título, (Des) Aprisionamentos, a
editora Scortecci apresenta Janete Santos passeando em outro universo, diferente
daquele da sala de aula, onde a Drª Janete desenvolve pesquisa e ensino de
língua materna (UFT, campus de
Araguaína). Nesse mundo das letras existem
seres (personagens típicos) que só ela conhece bem, por isso imprime no papel
as imagens vistas ou idealizadas. No outro
mundo de Janete (não deveria ser esse o título do livro?), o leitor vai
encontrá-la narrando diferentes episódios da vida cotidiana, situações estas possíveis
de serem vividas ou observadas nos mais diferentes centros urbanos. E o mais importante é perceber que esses
episódios são expostos a partir de uma cuidadosa elaboração artística, ocasião
em que sobressai o trato com a linguagem. Em todos os textos existe um
repertório de palavras selecionadas com rigoroso critério e talento. Esses fatos fazem com que os textos fiquem bem
elaborados, expondo, assim, a eficiente competência linguística da autora, e o
rigor que a língua padrão exige.
O livro (Des) Aprisionamentos, além de um Prefácio escrito por Eunice R. Henriques, e uma Apresentação de José Francisco da Silva Concesso, está dividido em duas partes:
Na primeira, estão as crônicas, e elas foram expostas por uma narradora que, ao invés de sair de casa com uma máquina fotográfica, parece que sai com lápis e papel na mão, pronta para registrar os fatos que vive ou apenas observa. O certo é que nada passa despercebido aos olhos dessa caçadora de fatos do cotidiano; de posse deles, ela transforma palavras em imagens para que o leitor possa vê-las também. Dentre os episódios “capturados”, pode estar um assalto, o desentendimento entre o caixa e sua cliente, podem ser digressões sobre o dia das mães, o dia dos namorados, ou sobre o “Ato falho” de uma mulher em uma loja de joias, ou ainda da outra cliente que não resiste a tentações de consumo e acaba comprando o que não precisa. Se a narradora está em casa, para não ficar sem ter o que fazer, ela reconta, a seu modo, a lenda do boto cor de rosa, que sai a fazer filhos em noite de lua cheia. Interessante nessa narrativa, independente do trabalho de desmitificação do objeto, é que o boto, seja por um ‘ato falho’ da narradora, seja proposital, segue classificado pelo olhar do caboclo, como peixe mesmo e não como mamífero.
Na
segunda parte do livro estão os contos.
Dentre eles destaca-se aqui o “Vaticínio”, nele um narrador deprimido
questiona a hipocrisia e os artifícios criados pela sociedade para que as
pessoas vivam um faz de conta, diante
da dura realidade da vida. Há também “Os
condenados”, surpreendente história medieval envolvendo reis cruéis e princesas
violentadas. Aqui o segredo mantido
debaixo dos lenções seria a solução para todos os problemas do reino, se não
fosse a truculência do chefe da guarda que manda matar a peça principal daquele
jogo. Outro destaque é A campanha de
Orélio que, por perceber ser falsa a ideia de unidade nacional, ele sai em
conferências pelo Brasil propondo dividir o país em três grandes regiões.
Além
desses, existem ainda outros episódios que merecem destaques, mas identificá-los
é uma tarefa a ser desempenhada a cada novo leitor.
Por outro lado, como nem tudo é perfeito,
alguns dos textos classificados como contos poderiam ser incluídos entre as crônicas,
visto que os mesmos não possuem aqueles elementos que distinguem um gênero do
outro.
Por
fim, vale destacar a cuidadosa capa elaborada pela poetisa e artista plástica
Eliane Cristina Testa. Aqui os (Des) Aprisionamentos
se manifestam a partir das folhas que se libertam de um emaranhado de arames e se
deixam levar pelo vento, para bem longe dali.
Enfim,
o livro (Des) Aprisionamentos não possui contra indicações. Sendo assim, ele é capaz
de propiciar boa e descontraída leitura, por isso pode ser indicado para todas as
idades.
Nenhum comentário:
Postar um comentário