Antonio Carlos Ribeiro*
O filme Tarja Branca – a revolução que faltava (Dir. Cacau
Rhoden, com Domingos Montagner, Wandi Doratiotto e Antônio Nóbrega –
Documentário, Brasil, 2014, 80 min) é composto de depoimentos de pessoas
adultas e amadurecidas, de diferentes origens, profissões e gerações que
descobriram que os momentos mais felizes, frutíferos e emocionalmente
enriquecedores de suas vidas aconteceram quando puderam ‘brincar’.
Esse ato plural, sempre com dimensões sociais – por envolver
pessoas, da família, da vizinhança, da escola, do trabalho e de diversas outras
dimensões humanas – nos coloca em contato com os momentos mais felizes da nossa
infância. Ao revivermos essas emoções, voltam à nossa memória as pessoas mais
queridas, que nos amaram da forma menos pretensiosa, com quem partilhamos
momentos inesquecíveis e que deixaram marcas indeléveis em nossa personalidade.
Voltar a esses momentos não é ‘perder tempo’, nem
‘desperdiçar energias com as saudades’ e menos ainda ‘remoer fatos do passado’,
mas redescobrir o ato de brincar, pelo qual o ser humano adulto reencontra a
criança dentro de si, reviver essa forma lúdica de enfrentar o cotidiano e
utilizá-la como estratégia para as grandes conquistas, que invariavelmente
começam com nossa harmonia e partilha de sentimento e trabalho.
O ato de brincar - dos mais ancestrais da raça humana –
embora esquecido na atualidade, nos traz a chave emocional para melhor nos
conhecer e nos relacionarmos com ‘os mundos’ à nossa volta. Mas, ainda mais
primordial do que o que revela de nós e dos seres humanos, é o que mostra
sobre o mundo em que vivemos.
Este documentário da Maria Farinha Filmes, dirigido por
Rhoden, discorre e estimula o espírito lúdico, mostrando que em última
instância as faces do homo (ser humano) socialis (social), aeconomicus (econômico), politicus
(político), faber (produtivo), sapiens (sábio) podem ser regastadas
no ludens (lúdico), sem confundir com
atos grosseiros, violentos, desrespeitosos, discricionários, arrogantes que mostram
à sociedade o homo demens (demente,
estúpido).
Como nos ensinou o historiador holandês Johan Huizinga, em
seu livro Homo Ludens, “a vida social
moderna está sendo cada vez mais fortemente dominada por uma característica que
tem alguma coisa em comum com o jogo e dá a ilusão de um fator lúdico
fortemente desenvolvido. Julguei poder dar a esta característica o nome de
‘puerilismo’, que me pareceu ser o mais adequado para designar essa mistura de
adolescência e barbárie que se tem vindo a estender pelo mundo no decorrer das
últimas duas ou três décadas”.
*Pós-Doutorando no
Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Tocantins (UFT/Capes)
- Campus Araguaína - e Pesquisador da Cátedra UNESCO de Leitura
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